quarta-feira, setembro 10, 2008

Antes que o diabo saiba que morreste


Fui ver ontem a ante-estreia do filme "Antes que o diabo saiba que morreste".
É um filme que vale a pena ver. Deixo de seguida a crítica do JN, com a qual concordo, mas antes queria partilhar uma frase que me ficou na memória, proferida pelo actor Philip Seymour Hoffman, que interpreta o papel de Andy:
"A soma de todas as minhas partes, não fazem aquilo que eu sou!"

Eis a crítica:

Regresso de Sidney Lumet

"Antes que o diabo saiba que morreste" marca reaparecimento do realizador, aos 84 anos

JOÃO ANTUNES

"Antes que o diabo saiba que morreste". Com um título assim, espera-se que nada de bom aconteça na tela. Aliás, o que se vê é muito mau. Ou melhor, é muito bom, porque Sidney Lumet regressa à forma que o celebrizou. Estreia esta quinta-feira.

O realizador mostra com tremendo realismo e intensidade uma história familiar que começa com o que deveria ser um pequeno delito e termina em tons de tragédia, digna de Shakespeare.

Explica-se desde logo que o título refere-se àquele momento em que se morre, mas em que o diabo ainda não sabe que morremos. As referências místicas casam bem com uma trama em que o racional vai perdendo terreno, cena a cena. No final, raras serão as personagens sem culpa. Pergunta-se é se a sua vida não estará desde logo no purgatório…

A história assinala a estreia no cinema de Kelly Masterson, que, no entanto, estará longe de ser um novato na escrita. A sua peça "Touch" levou-o já a encenar em Nova Iorque, há cerca de duas décadas. E, apesar de manter durante muitos anos um emprego num banco, nunca deixou de se dedicar à escrita de peças de teatro, encenadas um pouco por todo o país. Mas o fundamental a dizer é que Kelly Masterson é um antigo padre franciscano, que abandonou as vestes mesmo antes da ordenação, para se dedicar à escrita. Vendo "Antes que o diabo saiba que morreste" percebe-se que o autor do texto conhece bem os meandros do inferno.

Percebe-se também o que interessou Sidney Lumet. A história é a de dois irmãos que precisam de dinheiro: um para alimentar o vício da droga, o outro para pagar a pensão de alimentos à ex-mulher. O estratagema para resolver o problema é simples - assaltar a joalharia dos pais, num dia em que apenas lá está a empregada. Como o seguro paga, ninguém fica a perder. Mas a intriga complica-se. E ainda há o caso da mulher de um dos irmãos compensar a impotência do marido com o fulgor sexual do cunhado…

Sidney Lumet encontrou na estrutura narrativa da obra um meio de dar azo à vertigem cinematográfica que no passado deu origem a alguns dos seus melhores filmes, de "Serpico" a "Vida de cão". E o seu enorme "vício" em trabalhar com grandes actores é aqui plenamente satisfeito. Philip Seymour Hoffman, Ethan Hawke, Marisa Tomei e Albert Finney mostram talento e, sobretudo, coragem para se desnudarem, tanto carnal como espiritualmente, mostrando do que é capaz o ser humano, em especial quando é acometido pelo desespero.

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