segunda-feira, março 30, 2009

A aprender



Protagonistas reconstituem fuga de Álvaro Cunhal de Peniche

Reportagem Multimédia retirada do JN
ADELINO CUNHA

Joaquim Gomes e Carlos Costa voltaram à prisão para recordar a fuga com Álvaro Cunhal e mais um grupo de dirigentes do PCP. Depois do ter sido preso no Luso, esta fuga marca o início do exílio do líder comunista até ao 25 de Abril. Veja a reportagem multimédia















A multidão que palmilha as ruas da vila ainda vocifera impropérios contra o árbitro do jogo de futebol que terminara uns minutos antes. Há uma figura estranha que circula em sentido contrário. Um guarda da GNR desarvorado e sem chapéu berra com ardor: "Fui traído! Fui traído!". Berra alto o azedume. Um homem corre na sua direcção, agarra-se a ele e pragueja ainda com mais estardalhaço ofensas ao árbitro. A fuga podia ter acabado neste andamento do Diabo, mas não, não acabou: Cunhal, Joaquim Gomes, Jaime Serra, Carlos Costa, Francisco Miguel, Pedro Soares, Rogério de Carvalho, Guilherme Carvalho, José Carlos e Francisco Martins Rodrigues conquistam a liberdade.

"O homem meteu-se por Peniche aos gritos, fui atrás dele e, quando o apanhei no meio da confusão, comecei a gritar ainda mais alto. Fartei-me de gritar nomes ao árbitro!", recorda Joaquim Gomes. "Foram os meus gritos que acalmaram a situação".

Jorge Alves cedera aos apetites dos sentidos e aceitara dinheiro para facilitar a fuga. Fora recrutado por Joaquim Gomes durante uma breve troca de palavras. É preciso ver que os presos estão proibidos de se dirigirem aos guardas. Vive-se ao ritmo dos incontáveis sons do apito e em obediência às vozes de mando. Joaquim Gomes arrisca. Há riscos piores: o risco do tédio dos dias que desfiam e o risco de morrer sem dar por nada. "A primeira coisa que fazíamos ao chegar a uma prisão era estudar as possibilidades de fuga". O contacto com o guarda foi um tiro no escuro. "Não sabíamos como ele iria reagir, mas disse tanto mal do Salazar, que o Álvaro Cunhal e o Jaime Serra concordaram em usá-lo".

A determinação de coagir psicologicamente os presos está pespegada no cartaz do regulamento prisional colocado na parede: o preso deve ter a sensação de que está permanente sob a vigilância dos guardas. "Queriam criar a ideia de que não podíamos fazer nada sem que nos vissem, mas a verdade é que recrutámos um deles para nos ajudar a fugir", ironiza Carlos Costa.

Joaquim Gomes estabelece o contacto com o guarda Jorge Alves e os dirigentes no exterior tratam dos pormenores: acertar a fuga e pagar a colaboração muda. Dias Lourenço, Pires Jorge e Octávio Pato congeminam o plano e escolhem um domingo: dia 10 de Janeiro. "Havia menos PIDES. Iam à sua vida", invoca Joaquim Gomes.

Os dirigentes no exterior aceitam a aposta na colaboração do GNR, mas advertem para os riscos de a operação abortar e provocar um aumento da repressão. "Se aquilo desse para o torto havia de ser bonito", lembra Pires Jorge. As coisas parecem correr mal a certa altura. O GNR comunica uma súbita alteração das escalas. A fuga terá de ser antecipada para dia 3 de Janeiro. As coisas parecem mesmo correr mal.

Os fugitivos mantêm-se inabaláveis: querem fugir. Cedem em aspectos fundamentais da segurança e abandonam a ideia do corte das linhas telefónicas em redor de Peniche para evitar as comunicações após a fuga. Irão fugir no dia 3.

Está tudo pronto. No largo fronteiriço ao Forte de Caixas, o actor Rogério Paulo pára o automóvel, abre e fecha o porta-bagagens. São quatro da tarde. Dois minutos depois, vai embora. Está dado o sinal para os presos das celas do lado norte.

Após o jantar das 19 horas, os guardas fazem soar os apitos para os presos recolherem às celas. Cunhal está no grupo que regressa ao pavilhão C sem protecção especial: somente um guarda prisional. Guilherme da Costa Carvalho ataca: neutraliza-o com um toalha embebida em clorofórmio e é o próprio Cunhal quem lhe enfia na boca uma peça que impede o guarda de enrolar involuntariamente a língua e arriscar uma morte por asfixia. "Nem piou", afirma Jaime Serra. É preciso acrescentar que tudo isto se passa ao som da 6ª Sinfonia de Tchaikovsky, tocada no gira-discos do preso Humberto Lopes, autorizado a usufruir desse pequeno prazer num contexto de descompressão do regime prisional.

Ninguém presta atenção aos acordes. Dirigem-se de imediato para a porta do refeitório. É aqui que são esperados pelo guarda Jorge Alves. Um após outro, os presos colocam-se debaixo do seu capote, atravessam o pequeno pátio paralelo às celas, passam numa zona vigiada visualmente por um segundo guarda, continuam até perto de um muro que terão de saltar.

A operação corre normalmente até ao instante em que o guarda decide abortar o plano abruptamente. "Ele andava cada vez mais assustado à medida que o tempo passava e na noite da fuga esperava cinco ou seis presos e apareceram-lhe dez", justifica Joaquim Gomes.

O guarda cede aos seus demónios pessoais, entra em pânico e decide fugir. "Os últimos tiveram de fazer o percurso sozinhos, rastejando e andando de cócoras". Dificilmente poderiam passar pelo segundo guarda. "Viemos depois a saber que era cunhado do Jorge Alves. De certeza que nos viu, mas fingiu".

Chegar ao piso inferior exige agora um salto considerável. Atiram-se para cima de uma figueira e alcançam os terrenos das hortas. Pedro Soares precipita-se, cai e fere-se num joelho. Continuam. Têm de percorrer mais um troço vulnerável e só depois alcançam a muralha. Conseguem. Escondem-se dentro da guarita. Há silêncios que podem ser de morte.

É aqui que Jaime Serra fixa os lençóis sabiamente atados por Francisco Miguel e lança a corda através da ameia. Começam a descer pela muralha na direcção do fosso, mas, chegados lá abaixo, irão provar uma amarga surpresa que ameaçará novamente comprometer a fuga. Guilherme da Costa Carvalho larga a corda demasiado cedo, abate-se sobre os pedragulhos na base da muralha e acaba estendido no chão a sangrar da cabeça. Fica ferido.

O fracasso esteve iminente desde o início. O guarda corrompido por diversas vezes deu sinais de desistência, forçou uma alteração do dia da fuga que impediu a aplicação das medidas de segurança e no decorrer da própria fuga desistiu e desistiu dramaticamente.

"Quando demos por ele estava a descer a muralha com as botas cardadas a roçar pelas paredes abaixo. Aquilo fazia um barulho imenso", lamenta Joaquim Gomes.

A fuga continua. Descida a muralha, o êxito está aqui mais perto. Carlos Costa ampara o corpulento Guilherme da Costa Carvalho pelo fosso até ao último muro que os separa da liberdade: avistam os carros e correm. O carro de Cunhal é dos primeiros a arrancar.

Dois homens ficam para trás e perdem-se na direcção da vila. Joaquim Gomes corre no encalço de Jorge Alves. O guarda da GNR desarvorado e sem chapéu berra com ardor: "Fui traído! Fui traído!". Berra alto o azedume. Joaquim Gomes corre na sua direcção, agarra-se a Jorge Alves e pragueja ainda com mais estardalhaço ofensas ao árbitro. Regressam aos carros e fogem. A fuga termina com sucesso neste andamento do Diabo.

sexta-feira, março 27, 2009

E depois do mercado

Fernanda Câncio
in, DN


Na Visão de ontem, uma série de economistas e outros especialistas vem, na senda de Silva Lopes, defender uma descida generalizada dos salários em 20%. O motivo é a crise, assim como, na formulação de António Nogueira Leite, "o desfasamento entre a produtividade e os custos laborais". Não sendo a economia o meu forte, acompanho Manuel Carvalho da Silva, citado na revista como ficando "maldisposto com a discussão".
Num país onde a diferença entre os rendimentos dos mais ricos e dos mais pobres é das maiores da Europa, onde o ordenado mínimo é metade do praticado em Espanha mas os salários dos gestores estão ao nível dos auferidos na Alemanha, e onde o preço dos bens de consumo é equiparado (quando não superior) ao que se pratica no resto da UE, haver quem ache que o caminho é baixar ainda mais os salários de todos custa um bocado a perceber. Claro que num contexto específico - o de uma empresa que arrisca fechar - se aceitam ajustes para salvar postos de trabalho. Mas estabelecer isso como regra geral, ainda por cima fundamentando-a numa espécie de fatalidade estrutural - a do tal desfasamento -, acrescentando ainda que "os portugueses se habituaram mal", surge apenas imoral.
O salário médio dos portugueses é baixo e baixá-lo global e cegamente não pode ser solução. Primeiro porque muitas pessoas já vivem no limiar da pobreza - mesmo se o nível de vida médio tem aumentado e as expectativas, felizmente, não têm comparação com as que existiam há 30 anos (será isso o "mau hábito"?). Em segundo lugar, a ideia de que o investimento estrangeiro poderá ser atraído com salários mais baixos já provou há muito a sua valia - há sempre salários mais baixos noutro lado, e é impossível (e indesejável) competir nesse quesito com países em que as pessoas não têm direitos. Se há empresas que só podem sobreviver com trabalho escravo, então não devem sobreviver - e essa é provavelmente uma das grandes consequências desta crise, a da inevitabilidade de reformulação de certos sectores, sob pena de desaparecerem. Terceiro: a animação da economia também depende do consumo - se se baixarem 20% os salários de toda a gente, é muito provável que o consumo baixe pelo menos nessa percentagem, implicando a descida de preços, falência de mais empresas e, por arrasto, uma eventual nova descida dos salários, numa espiral sem fim.
Alegar que por mais que se resista à ideia a redução salarial se aplicará "a bem" (por acordo) ou "a mal" (devido ao dumping criado pelo aumento do desemprego) é, paradoxalmente, negar a existência do mercado: mesmo num contexto de crise há sectores que florescem. E se foi uma ideia de mercado em roda livre e louca, sem relação com a realidade e o realismo, que nos trouxe onde estamos, convém talvez não querer substituí-lo completamente. É capaz de haver uma outra via - a ver se a encontramos, de preferência sem histerias e mantendo em vista algo de fundamental: a dignidade das pessoas e do trabalho.

Playboy à Portuguesa



quinta-feira, março 26, 2009

Aprendi a amar

Aprendi a amar pela madrugada
no frio denso, no frio denso
com os dentes fechados a morder o lenço
sem poder calcar a porta de entrada
aprendi a matar bem mais do que penso
aprendi a matar bem mais do que penso.

Aprendi a amar com as duas mãos
de amor intenso, de amor intenso
uma para a ferida outra para o penso
a molhar os dedos nos líquidos sãos
aprendi a matar bem mais do que penso
aprendi a matar bem mais do que penso.

Aprendi a amar junto dos armários
queimando incenso, queimando incenso
repetindo mais palavras por extenso
aprendi a amar por motivos vários
aprendi a matar bem mais do que penso
aprendi a matar bem mais do que penso.

Aprendi a amar derramando vinho
no mar imenso, no mar imenso
a ver se não perdia o que sei que não venço
deixando corpos caídos no caminho
aprendi a matar bem mais do que penso
aprendi a matar bem mais do que penso.

Amores de Marta

Que rua tão torta e tão longa, a do amor
Que vento tão forte lá sopra, é o do amor
Por vezes parece uma rua assombrada
Com sombras de bruxa fazendo de fada

Que faço eu na rua deserta do amor
Não há uma só porta aberta pró amor
Por vezes lá se abre uma frincha de nada
Na porta do amor que eu queria escancarada

Aguenta aí

O meu nome é Joaquim
o meu apelido Mendes
sou do Porto, porque sim
mas também sou donde sendes

E quero aplaudir a gente
Que se amanda e que se mexe
É p´lo menos ponto assente
Não ficar no queixe-queixe

Mas não vou dizer amen
quando as coisas dão p´ro torto
embora haja para quem
criticar é só desporto

Aguenta aí, não és santo nem és padre
Fazes por ti, mas não há cão que não te ladre
Há dias de manhã
em que um homem à tarde
não pode sair à noite
nem voltar de madrugada
Grande piada!

Cada dia, saio cedo
p´ra um trabalho mesmo chato
e o patrão diz-me em segredo
fazes bem e sais barato

Tenho, pra não ir a pé
um carro em sétima mão
trava com a marcha à ré
e acelera, também não

Farto de engarrafamentos
aqui vai meu contributo
vou mas é mandar o trânsito
apanhar no viaduto

Aguenta aí, não és santo nem és padre
Fazes por ti, mas não há cão que não te ladre
Há dias de manhã
em que um homem à tarde
não pode sair à noite
nem voltar de madrugada
Grande piada!

Atirei o pau ao gato
que se vendia apor lebre
vou passear ao Palácio
mas habito num casebre

Busquei casa na cidade
há justiça nesta vida
a prova é que a má qualidade
está tão bem distribuída

Património mundial
é orgulho, com certeza
falta pôr no pedestal
"aqui não entra a pobreza"

a-a-e-i-o

A-A-E-I-O vai para a neta o que foi d´ávó
A-A-E-I-O vai para a neta o que foi d´ávó

A vida de quem anda
às ordens de quem manda
já cheira que tresanda
não anda nem desanda
não anda nem desanda
não anda nem desanda

A vida de quem cresce
a pensar que a merece
não esquenta nem aquece
nem sequer arrefece
nem sequer arrefece
nem sequer arrefece

(A-A-E-I-O...)

(A vida de quem anda...)

A vida de quem chora
à espera duma aurora
que leve a noite embora
bem perde pla demora
bem perde pla demora
bem perde pla demora
(A-A-E-I-O...)

(A vida de quem anda...)

A vida de quem cata
pulgas numa barata
é tão longa e tão chata
não ata nem desata
não ata nem desata
não ata nem desata
(A-A-E-I-O...)

A-A-E-I-O bate na neta quem bateu n´ávó
A-A-E-I-O bate na neta quem bateu n´ávó

A-A-E-E-I bate na neta quem bateu em ti
A-A-E-E-I bate na neta quem bateu em ti

A-E-I-O-U s´a canção não t´agrada, mete-a no...

A vida é feita de pequenos nadas

(Segunda-feira
trabalhei de olhos fechados
na terça-feira
acordei impaciente
na quarta-feira
vi os meus braços revoltados
na quinta-feira
lutei com a minha gente
na sexta-feira
soube que ia continuar
no sábado
fui à feira do lugar
mais uma corrida, mais uma viagem
fim-de-semana é para ganhar coragem)

Muito boa noite, senhoras e senhores
muito boa noite, meninos e meninas
muito boa noite, Manuéis e Joaquinas
enfim, boa noite, gente de todas as cores
e feitios e medidas
e perdoem-me as pessoas
que ficaram esquecidas
boa noite, amigos, companheiros, camaradas
a vida é feita de pequenos nadas
a vida é feita de pequenos nadas

Somos tantos a não ter quase nada
porque há uns poucos que têm quase tudo
mas nada vale protestar
o melhor ainda é ser mudo
isto diz de um gabinete
quem acha que o casse-tête
é a melhor das soluções
para resolver situações
delicadas
a vida é feita de pequenos nadas

E o que é certo
é que os que têm quase tudo
devem tudo aos que têm muito pouco
mas fechem bem esses ouvidos
que o melhor ainda é ser mouco
isto diz paternalmente
quem acha que é ponto assente
que isto nunca vai mudar
e que o melhor é começar a apanhar
umas chapadas
a vida é feita de pequenos nadas

(Segunda-feira
trabalhei de olhos fechados
na terça-feira
acordei impaciente
na quarta-feira
vi os meus braços revoltados
na quinta-feira
lutei com a minha gente
na sexta-feira
soube que ia continuar
no sábado
fui à feira do lugar
mais uma corrida, mais uma viagem
fim-de-semana é para ganhar coragem)

Muito boa noite, senhoras e senhores
muito boa noite, meninos e meninas
muito boa noite, Manuéis e Joaquinas
enfim, boa noite, gente de todas as cores
e feitios e medidas
e perdoem-me as pessoas
que ficaram esquecidas
boa noite, amigos, companheiros, camaradas
a vida é feita de pequenos nadas
a vida é feita de pequenos nadas

Ouvi dizer que quase tudo vale pouco
quem o diz não vale mesmo nada
porque não julguem que a gente
vai ficar aqui especada
à espera que a solução
seja servida em boião
com um rótulo: Veneno!
é para tomar desde pequeno
às colheradas
a vida é feita de pequenos nadas
boa noite, amigos, companheiros, camaradas
a vida é feita de pequenos nadas.

A paixão do velho Pires, o marinheiro

Ai, o amor quando nos toca
é como se tocasse um sino
um hino, um trino
de um alegre passarinho

Vou voar para o teu ninho
vou tentar fazer o pino
vou ser bailarino
argentino, desatino

Mas que hei-de eu fazer?
O amor é um furacão
desgovernando
a minha embarcação

A noite passada

A noite passada acordei com o teu beijo
descias o Douro e eu fui esperar-te ao Tejo
vinhas numa barca que não vi passar
corri pela margem até à beira do mar
até que te vi num castelo de areia
cantavas "sou gaivota e fui sereia"
ri-me de ti "então porque não voas?"
e então tu olhaste
depois sorriste
abriste a janela e voaste

A noite passada fui passear no mar
a viola irmã cuidou de me arrastar
chegado ao mar alto abriu-se em dois o mundo
olhei para baixo dormias lá no fundo
faltou-me o pé senti que me afundava
por entre as algas teu cabelo boiava
a lua cheia escureceu nas águas
e então falámos
e então dissemos
aqui vivemos muitos anos

A noite passada um paredão ruiu
pela fresta aberta o meu peito fugiu
estavas do outro lado a tricotar janelas
vias-me em segredo ao debruçar-te nelas
cheguei-me a ti disse baixinho "olá",
toquei-te no ombro e a marca ficou lá
o sol inteiro caiu entre os montes
e então olhaste
depois sorriste
disseste "ainda bem que voltaste"

A barca dos amantes

Ah, quanto eu queria navegar
p´ra sempre a barca dos amantes
onde o que eu sei deixei de ser
onde ao que eu vou não ia dantes

Ah, quanto eu queria conseguir
trazer a barca à madrugada
e desfraldar o pano branco
na que for terra, mais amada

E que em toda a parte
o teu corpo
seja o meu porta-estandarte
plantado no seu mais fundo
posso agitar-me no vento
e mostrar a cor ao mundo

Ah, quanto eu queria navegar
p´ra sempre a barca dos amantes
onde o que eu vi me fez vogar
de rumos meus a cais errantes

Ah, quanto eu queria me espraiar
fazer a trança à calmaria
avistar terra, e não saber
se ainda o é, quando for dia

E que em toda a parte
o teu corpo
seja o meu porta-estandarte
plantado no seu mais fundo
posso agitar-me no vento
e mostrar a cor ao mundo

Uma reflexão acerca de lixo




Certo dia, quando trabalhava no JL, fui incumbido de entrevistar uma escritora chamada Adília Lopes. A primeira pergunta que lhe fiz foi sobre um poema seu de que eu gostava e gosto muitíssimo. Chama-se Autobiografia sumária e só tem três versos: "Os meus gatos / gostam
de brincar / com as minhas baratas." O meu objectivo era impressionar a autora com a minha excelente interpretação do poema. Disse-lhe que aqueles versos eram também o resumo da minha vida. Os meus gatos, isto é, aquilo que em mim é felino, arguto, crítico ("Não é por acaso", disse eu, "que Fialho de Almeida reuniu os seus textos críticos num volume chamado Os Gatos"), aquilo que em mim é perspicaz - e até cruel - gosta de brincar com as minhas baratas, ou seja, com aquilo que em mim é repugnante, negro, rasteiro, vil. E aquela operação poética - que é, igualmente, uma operação humorística - de escarnecer de si próprio era-me tão familiar que podia descrever-me de forma tão competente como à autora do poema.

Os olhos de Adília Lopes humedeceram-se. Fosse qual fosse a noite solitária em que escreveu o poema, estava longe de imaginar que, tanto tempo depois, a sua alma gémea se apresentasse à sua frente, compreendendo-a tão profundamente. Foi então que Adília Lopes falou. Disse o seguinte: "Pois. Bom, comigo, o que se passa é que eu tenho gatos. E tenho também baratas, na cozinha. E os gatos gostam de ir lá brincar com elas." E depois exemplificou, com as mãos, o gesto que os gatos faziam com as patinhas.

Foi naquele dia, amigo leitor, que eu deixei de me armar em esperto. Tinha citado Fialho de Almeida, tinha usado a expressão "operação poética", e tinha-me visto a mim onde só havia gatos e baratas. Os olhos de Adília Lopes estavam húmidos, provavelmente, do esforço que a sua proprietária fazia para não rir. Não eram só os sacanas dos gatos que escarneciam de mim: a Adília Lopes também. E, desde esse dia, tenho constatado que o mundo inteiro, em geral, me mofa (quem aprecia a frase bem torneada fará bem em registar, num caderninho próprio, a elegante construção "me mofa").

Vários filósofos têm reflectido sobre o lixo, sobretudo acerca do modo como a nossa sociedade trata o seu lixo. Eu estou magoado com o modo como a nossa sociedade trata o meu lixo em especial. Não me interessa o tratamento que a sociedade dá ao seu lixo: a forma como trata o meu é humilhante. O lixo de Adília Lopes gera vida e poemas. O meu lixo não só não gera nada como tem uma falta de personalidade que o amesquinha quase tanto quanto me amesquinha a mim. É muito frequente encontrar-me na circunstância de ter lixo na mão e, quando confrontado com os rótulos que hoje designam as várias secções dos caixotes do lixo (cartão, papel, embalagens, vidro), verificar que o lixo que eu possuo se enquadra, invariavelmente, na categoria dos indiferenciados. Quase todo o meu lixo se caracteriza por uma falta de carácter que só posso ser eu a transmitir--lhe. Eis, afinal, a minha autobiografia sumária: "O meu lixo / é tão desinteressante / como eu."

quarta-feira, março 25, 2009

O próximo golo do Benfica



Descubra as diferenças





Ainda é só o começo


Jim Morrison e Mário de Sá Carneiro falavam do "FIM", Gabriel O Pensador anunciava que "Ainda é só o começo!"

Por me identificar com a seguinte mensagem:





partilho convosco o sítio de onde ela foi retirada, e onde se pode ver uma BD com um Tintin Revolucionário.

Apreciem!

Guilherme Rietsch Monteiro

Remendos e côdeas

Manuel António Pina
in, JN


Os sindicalistas bons, que não são "instrumentalizados" nem fazem greves e manifestações e "aposta(m) na concertação e não no conflito", reuniram-se em congresso, durante o qual o seu "programa de acção" foi aprovado com 90% de votos.

Um dia depois, em resposta a declarações do líder do patronato, segundo as quais um salário mínimo de 500 euros em… 2011 é apenas uma "indicação" e "iremos ver se é possível", o secretário-geral reeleito explicitou em que consiste a "aposta": o sindicalismo bom "espera" que o próximo Governo "seja sensível".

Este tipo de sindicalismo não reivindica, "espera", não reconhece o salário como direito de quem trabalha, mas como prodigalidade. Se o próximo Governo for "sensível", e o patronato também, "darão" em 2011 aos trabalhadores um salário mínimo compatível, como os pedintes dizem, com as suas possibilidades.

Em contrapartida, os sindicatos e os sindicalistas bons continuarão a ser bons, se possível ainda melhores, e a não perturbar o trânsito nem impedir os jornalistas igualmente bons da Antena 1 de chegar a horas às conferências de imprensa da CIP e do Governo.



Remendos e côdeas
José Mário Branco

Sempre que se rompe o casaco do povo
Aparecem uns doutores que descobrem
Que assim não pode ser
Há que achar remédio
Seja lá como for

Vão então negociar com os senhores
Enquanto cá fora os trabalhadores
Ao frio esperam que eles voltem triunfantes com
Um belo remendo

Remendo sim pois bem mas onde é que ficou
O casaco todo?

Sempre que gritamos "basta temos fome!"
Aparecem uns doutores que descobrem
Que assim não pode ser
Há que achar remédio
Seja lá como for

Vão então negociar com os senhores
Enquanto cá fora os trabalhadores
Cheios de fome até que voltem triunfantes com
Uma bela côdea

Côdea sim pois bem mas onde é que ficou
A carcaça toda?

Nós não precisamos só desses remendos
Precisamos do casaco por inteiro
Nós não queremos ficar só com essa côdea
Precisamos de comer o pão inteiro

Não nos basta que o patrão nos dê trabalho
Precisamos de mandar nas oficinas
Nos campos e nas minas
No poder de Estado
Disso é que precisamos

Mas o que é que essa gente tem para oferecer?
Remendos e Côdeas!

Roubo(s)

Manuel António Pina
in, JN


Uma petição de sportinguistas exigindo a repetição da final da Taça da Liga "porque nós merecemos a taça, lutámos por ela com honra e amor à camisola" reuniu, em poucas horas, mais assinaturas que petição idêntica que anda há uma eternidade na Net (na Net, clica-se em qualquer sítio e aparecem duas ou três petições) apelando à demissão de Dias Loureiro do Conselho de Estado na sequência do caso BPN e dos "seus comportamentos que põem em causa o bom-nome do Conselho de Estado, da Presidência da República e do País".

Quem julgasse que trafulhices de milhões como as do BPN chegariam para comover a Pátria, nunca, como na redacção daquela menina de Leiria, foi lá, à Pátria. A Pátria comove-se é com "penalties" roubados, não com milhões roubados. A Pátria não faz a mínima ideia do que é um milhão e está-se nas tintas (como o povo diz, isso são coisas "lá deles") para "o bom-nome do Conselho de Estado (de quem…?), da Presidência da República e do País". Ponham-lhe à frente uma petição a exigir a demissão do Eduardo de "Podia acabar o mundo" do tal Conselho de Estado, e essa, sim, a Pátria assina logo.

Os super-heróis

Manuel António Pina
in, JN


Na Tailândia, um menino autista de oito anos que se isolara na varanda de um 3.º andar e aparentemente fazia tenção de se suicidar foi salvo por um bombeiro que, sabendo quanto ele gostava de super-heróis, se vestiu de Homem-Aranha. "Parece incrível, mas o menino lançou-se-lhe nos braços assim que o viu", relatou o sargento Virat Boonsadao.

O autismo é uma doença terrível, causadora de grande sofrimento, segundo se supõe (sabe-se ainda muito pouco) provocado por uma insuportável e permanente tensão ao nível das meninges. Fazer deste caso, comovente, uma alegoria pode parecer cruel. Mas interrogo-me se os povos, como os indivíduos, não podem também ser "autistas", se o alheamento, os interesses limitados, o défice de atenção e a incapacidade de resposta ao que, a nível social e político, se passa à sua volta, acompanhados do gesto repetitivo de votar sempre nos mesmos partidos, não serão características de uma cultura autista. Povos assim lançam-se facilmente nos braços do primeiro bombeiro que, vestido de super-herói, lhes aparece pela frente. Basta ver as sondagens.

sexta-feira, março 20, 2009

Eu não sei fazer música

Eu não sei fazer música
Mas eu faço
Eu não sei cantar as músicas que faço
Mas eu canto
Eu não tenho certeza
Mas eu acho
Eu não sei o que falar
Mas eu falo
Ninguém sabe nada
Ninguém sabe nada
Ninguém sabe nada
Ninguém sabe nada
Você você você você você você
Ninguém sabe nada

Queima de recibos verdes




No próximo dia 21 de Março, desperta a primavera. É a partir do equinócio que dias e noites têm a mesma duração.

Este ano, o MayDay Porto vai assinalar o equinócio com uma fogueira na rua: será a queima dos recibos verdes.

Em Portugal, cerca de 900 mil pessoas trabalham como 'falsos' recibos verdes; são falsos trabalhadores independentes. Falsos porque deveriam ter um contrato de trabalho: cumprem horário, têm subordinação hierárquica e trabalham não em casa mas numa empresa ou num serviço do Estado. Os recibos verdes são assim utilizados para mascarar uma situação de trabalho por conta doutrem. Noutros casos, são apenas uma forma que impede que o trabalho intermitente tenha protecção social.

Em Portugal, cerca de 900 mil pessoas não têm protecção social, não têm direito ao subsídio de desemprego se ficarem sem trabalho, nem a protecção na doença. Muitas delas, acumulam dívidas imensas à segurança social e não têm sequer o direito de planear e organizar o futuro.

Os falsos recibos verdes são, na maior parte dos casos, um abuso, uma mentira e uma exploração para que os trabalhadores tenham menos direitos. O Estado é um dos grandes utilizadores desta falcatrua.

Estamos fartos. E com o despertar da Primavera, despertam também os nossos gritos de revolta. Na fogueira do equinócio vamos queimar este símbolo maior da precariedade. As nossas noites terão a mesma duração dos nossos dias e ambos têm sempre a exacta duração da nossa luta.

Dia 21 de Março, traz a tua indignação e vem queimar os teus recibos. Porque é a sede de justiça e de dignidade que desperta em nós profundas primaveras!

segunda-feira, março 16, 2009

Dança Nua


Dança Nua - Essa Entente



Tão perto daquela antiga avenida
Passeiam as moças da noite
Que hão-de chamar ao meio das pernas
Os olhares que passam

Uma quer levar-me, mas eu não vou ficar
Apenas vou sorrir, passar

Desço ao cais onde o brilho da ponte
Ilumina um bar tão vazio
Mas sei que tão cheio vai ficar
Por mil tragos, avancem

Uns para o meu lado, outros para a frente
Vamos lá rapazes por mil tragos cantar

Eram já três, venham mais duas
As damas ao meio p'ra dança nua
E uma volta a entornar, e outra voz a cantar
Trocam-se os passos no ar, esperem ainda que...

Eram já três, venham mais duas
As damas ao meio p'ra dança nua
E uma volta a entornar, e outra voz a cantar
Trocam-se os passos no ar, esperem ainda que...

Olhos inchados, descanso no cais
À beira de um barco esquecido
Que tal como eu já foi tão forte
Mas feliz só esta noite

Leva-me contigo, dentro de ti
Para depois voltar ao bar
E por mil tragos cantar

Eram já três, venham mais duas
As damas ao meio p'ra dança nua
E uma volta a entornar, e outra voz a cantar
Trocam-se os passos no ar, esperem ainda que...

Eram já três, venham mais duas
As damas ao meio p'ra dança nua
E uma volta a entornar, e outra voz a cantar
Trocam-se os passos no ar, esperem ainda que...

Eram já três, venham mais duas
As damas ao meio p'ra dança nua
E uma volta a entornar, e outra voz a cantar
Trocam-se os passos no ar, esperem ainda que...

Eram já três, venham mais duas
As damas ao meio p'ra dança nua
E uma volta a entornar, e outra voz a cantar
Trocam-se os passos no ar, esperem ainda que...

Ai vão, vão!


No programa "Contra-Informação" de ontem, a bonecada do PS cantava...

"É um longo caminho para a maioria
É duro manter o poder
É um longo caminho para a maioria
Ainda nos vamos foder"

Ai vão, vão!!!

Nos 3 actos eleitorais de 2009, vou votar Bloco de Esquerda! E tu?

quinta-feira, março 12, 2009

Coisas lindas

Jorge Prendas
in Blog das Vozes da Rádio

Numa altura que tanto se fala da inabilidade total que a directora da DREN demonstra para a escrita, a que se junta igualmente a incompetência para desempenhar as funções que desempenha, a falta de capacidade para cozinhar, para falar em público, para cortar as unhas, para se maquilhar e até para respirar, encontro hoje mesmo em Santa Cruz do Bispo, essa capital do bom gosto urbanístico, a justificação para tão mau português da Dra. Guida.
O meio que a rodeia é este: o dos neologismos, dos novos grafismos. Ela não erra. Ela reinventa. Ela é a figura messiânica de um futuro acordo ortográfico que renovará toda a nossa língua. Ela é a língua portuguesa do futuro. Há quem diga que ela é mesmo o software do Magalhães sob a forma de humanoide.
Este cartaz é um sinal. É um passo em frente para essa tal nova escrita, que quem recebe recados da Sotora já conhece bem.
Fica aqui a premonição da nova língua que se anuncia a espaços e fica a sugestão: para quem gosta de circo, aproveite este fim-de-semana. Os Ermãos Torralvo, estarão em Santa Cruz, mesmo em frente ao estabelecimento preseonal.

Um grande beijo de plástico para a Barbie


De todas as bonecas que partilham o nome com carniceiros nazis, posso dizer que a Barbie é, sem dúvida nenhuma, a minha favorita

Ricardo Araújo Pereira
in, Visão

O 50.º aniversário da Barbie foi assinalado pela generalidade da comunicação social com uma altivez que se reprova. Uma boneca não pode celebrar 50 anos sem que a imprensa entreviste inúmeros críticos e não tente sequer falar com a aniversariante. Os jornalistas argumentarão que, sendo a Barbie uma boneca oca sem nada na cabeça, não faz sentido dar-lhe tempo de antena na comunicação social - mas a verdade é que esse critério nunca foi suficiente para os impedir de entrevistar alguém. Basta pensarmos na quantidade de entrevistas que eu tenho dado.

A Barbie tem sido vítima de uma das mais chocantes campanhas negras alguma vez urdidas em Portugal, país em que se urdem a toda a hora campanhas negras especialmente chocantes. Uma boneca que, em 50 anos de vida, desempenhou 108 profissões diferentes (é das poucas pessoas do mundo que se pode gabar de, no espaço de uma década, ter tido carreiras profissionais bem sucedidas quer como astronauta quer como instrutora de aeróbica - algo que Neil Armstrong tentou sem sucesso, nunca tendo conseguido ensinar competentemente o bodypump), foi apontada como símbolo da mulher doméstica - uma acusação que só pode ser explicada pela inveja que a reforma acumulada da Barbie, forçosamente, provoca nos críticos.

Pois bem, vejo-me forçado a defender a Barbie, até porque a Mattel costuma processar quem se mete com ela. Defendendo a Barbie estou, aliás, a defender-me a mim mesmo: só no ano passado foram vendidas cerca de 100 milhões de Barbies, metade das quais são propriedade das minhas filhas. A Mattel fez a descoberta comercial do século: todas as meninas nascem com uma vocação especial para a pirosice que esteve durante milénios à espera de ser capitalizada.

Começo então por dizer o óbvio: de todas as bonecas que partilham o nome com carniceiros nazis, posso dizer que a Barbie é, sem dúvida nenhuma, a minha favorita. Nunca gostei especialmente da Goebbels Assistente de Bordo e sempre considerei a Himmler Patinadora um pouco sinistra, mas a Barbie tem aquele encanto suave que, digam o que disserem, faltava a Klaus Barbie - apesar de partilhar o seu porte ariano.
Claro que conheço as críticas segundo as quais o corpo da boneca é irrealista, mas não concordo. Actualmente há muitas senhoras que, quando chegam aos 50 anos, também já são quase todas de plástico. Tenho visto várias quinquagenárias bem mais inexpressivas do que a Barbie. E boa parte delas chega ao fim da vida com o rosto mais jovem que o Benjamin Button. Eis um filme cuja história é bem banal: basta ir a Cascais para ver meia dúzia de senhoras que sofrem da mesma doença.

quinta-feira, março 05, 2009

Dia Mau

Não quis guarda-lo para mim
E com a dimensão da dor
A legitimar o fim
Eu dei
Mas foi para mostrar
Nao havendo amor de volta
Nada impede a fonte de secar

Mas tanto pior
E quem sou eu para te ensinar agora
A ver o lado claro de um dia mau

Eu sei
A tua vida foi
Marcada pela dor de não saber aonde dói

Mas vendo bem
Não houve à luz do dia
Quem não tenha provado
O travo amargo da melancolia

E então rapaz,
Então porque a raiva se a culpa não é minha
Serão efeitos secundários da poesia

Mas para que gastar o meu tempo
A ver se aperto a tua mão
Eu tenho andado a pensar em nós
Já que os teus pés não descolam do chão
Dizes que eu dou só por gostar
Pois vou dar-te a provar
O travo amargo da solidão!

Eu tenho andado a pensar em nós
Já que os teus pés não descolam do chão
Dizes que eu dou só por gostar
Eu vou dar-te a provar
O travo amargo da solidão!

É só mais um dia mau, mau, mau
É só mais um dia mau, mau, mau
É só mais um dia mau
É só mais um dia mau
É só mais um dia mau

Morrer por ser preciso, nunca por chegar ao fim

Ninguém disse que os dias eram nossos
Ninguém prometeu nada.
Fui eu que julgei que podia arrancar sempre
Mais uma madrugada.

Ninguém disse que o riso nos pertence
Ninguém prometeu nada.
Fui eu que julgei que podia arrancar sempre
Mais uma gargalhada.

E deixar me devorar pelos sentidos,
e rasgar-me do mais fundo que há em mim
emaranhar-me no mundo, e morrer para ser preciso,
Nunca por chegar, ao fim.

Ninguém disse que os dias eram nossos
Ninguém prometeu nada
Fui eu que julgei que podia arrancar sempre, mais uma madrugada.
E deixar-me devorar pelos sentidos,
E rasgar-me do mais fundo que há em mim.
Emaranhar-me no mundo, e morrer por ser preciso,
Nunca por chegar ao fim.

E deixar-me devorar pelos sentidos,
e rasgar-me do mais fundo que ha em mim.
Emaranhar-me no mundo, e morrer por ser preciso,
nunca por chegar ao fim.

E deixar-me devorar pelos sentidos,
e rasgar-me do mais fundo que ha em mim.
Emaranhar-me no mundo, e morrer por ser preciso,
nunca por chegar ao fim.

E deixar-me devorar pelos sentidos,
e rasgar-me do mais fundo que há em mim.
Emaranhar-me no mundo, e morrer por ser preciso,
nunca por chegar ao fim.

Deixar-me devorar pelos sentidos

Mafalda Veiga

Pensa em mim protege o que eu te dou
Eu penso em ti e dou-te o que de melhor eu sou
Sem ter defesas que me façam falhar
Nesse lugar mais dentro
Onde só chega quem nao tem medo de naufragar

Fica em mim que hoje o tempo dói
Como se arrancassem tudo o que já foi
E até o que virá e até o que eu sonhei
Diz-me que vais guardar e abraçar
Tudo o que eu te dei

Olhar-te um pouco, enquanto acaba a noite
Enquanto ainda nenhum gesto te magoa
E o mundo for aquilo que sonhas nesse lugar só teu
Olhar-te um pouco, como se fosse sempre
Até ao fim do tempo, até amanhecer
E a luz deixar entrar o mundo inteiro e o sonho se esconder

Enquanto dormes, por um momento à noite
É um tempo ausente que te deixa demorar
Sem guerras nem batalhas para vencer, nem dias para rasgar
Eu fico um pouco, por dentro dos desejos
Por mil caminhos que sao mastros e horizontes
Tao livres como estrelas sobre os mares e atalhos pelos montes

A noite vem às vezes tao perdida
E quase nada parece bater certo
Ha qualquer coisa em nós inquieta e ferida
E tudo o que era fundo fica perto
Nem sempre o chao da alma é seguro
Nem sempre o tempo cura qualquer dor
E o sabor a fim do mar que vem do escuro
É tanta vezes o que resta, do calor

Trocamos as palvras mais escondidas
Que só a noite arranca sem doer
Seremos cumplices o resto da vida
Ou talvez só ate amanhecer
Fica tao facil entregar a alma
A quem nos traga um sopro do deserto
Olhar onde a distância nunca acalma
Esperando o que vier de peito aberto

Se eu fosse a tua pele
Se tu fosses o meu caminho
Se nenhum de nós se sentisse nunca sozinho

Se um gesto cair assim
Despedaçado
Se eu nao souber
Recolher a dor
Se te esperar a céu aberto
Onde se enconde
O que tu és que eu também sou
É que hoje mais que qualquer outra noite
Ha qualquer coisa que me fere
E que me faz querer tanto ter-te aqui

Nalgum lugar perdido vou procurar sempre por ti
Ha sempre no escuro um brilho, um luar…
Nalgum lugar esquecido eu vou esperar sempre por ti

Mesmo que a vida mude os nossos sentidos
E o mundo nos leve pra longe de nós
E que um dia o tempo pareça perdido
E tudo se desfaça num gesto só

Eu vou guardar cada lugar teu
Ancorado em cada lugar meu
E hoje apenas isso me faz acreditar
Que eu vou chegar contigo
Onde só chega quem nao tem medo de naufragar

E deixar-me devorar pelos sentidos
E rasgar-me do mais fundo que há em mim
Emaranhar-me no mundo
E morrer por ser preciso
Nunca por chegar ao fim…

terça-feira, março 03, 2009

Baile dos Vampiros


Madrugada de 28 de Fevereiro, para 1 de Março de Março de 2009. Os Clã sobem ao palco do Teatro Sá da Bandeira, para encerrar o Fantasporto, no já célebre Baile dos Vampiros. Num ambiente "vampiresco", em que tornaram algumas das suas músicas mais "tenebrosas", tocaram ainda algumas versões de outros. Foi o caso de "The Beautiful People" de Marilyn Manson:

The Beautiful People
Marilyn Manson

I don't want you and I don't need you
Don't bother to resist, Or I'll beat you
It's not your fault that you're always wrong
the weak ones are there to justify the strong.

The beautiful people, the beautiful people
it's all relative to the size of your steeple
you can't see the forest for the trees
and you can't smell your own shit on your knees

There's no time to discriminate, hate every motherfucker that's in your way

Hey you, what do you see?
something beautiful, something free?
hey you, are you trying to be mean?
you live with apes man, it's hard to be clean

(Ahh)
(Ahh)

the worms will live in every host
it's hard to pick which one they eat most
the horrible people, the horrible people
it's as anatomic as the size of your steeple

capitalism has made it this way,
old-fashioned fascism
will take it away

Hey you, what do you see?
something beautiful, something free?
hey you, are you trying to be mean?
you live with apes man, it's hard to be clean

There's a chance to discriminate,
hate every motherfucker that's in your way

The Beautiful People, The Beautiful People
The Beautiful People, The Beautiful People

Hey you, what do you see?
something beautiful, something free?
hey you, are you trying to be mean?
you live with apes man, it's hard to be clean