sexta-feira, janeiro 22, 2010

Competência para amar

Vieste comigo
nesse jeito pós-moderno
de não querer saber nada
de não fazer perguntas
essa pose cansada
tão despida de emoção
de quem já viu tudo
e tudo é uma imensa
repetição

não fosse a minha competência para amar
e nunca teriamos acontecido
num mundo de competências
e técnicas de ponta
a dádiva da fala
quase já não conta

depois quase ias embora
desse modo
evanescente
não soubesse eu ver-te
tão transparente
e teria sido apenas
o encontro acidental
uma simples vertigem
dum desporto radical

não fosse a minha competência para amar
e nunca teriamos acontecido
num mundo de competências
e técnicas de ponta
a dádiva da fala
quase já não conta

Latin N'América

Todas as manhãs o sol espelha
Bate nas lentes escuras
O sangue jorra de esguelha
Na pala das ditaduras

Continente grita de dor
Rebenta pelas costuras
A morte,o medo e o terror
São dias feitos agruras

Do Paraguai a Porto Rico
Salvador às Honduras
Da Bolívia à Guatemala
Argentina ao Chile

[refrão]
Latina ' América
Latina ' América
Latina ' América
Latina ' América

Descem das montanhas
Para pôr fim a essa sina
Que te rebenta as entranhas
Capacete em cada esquina

Todas as manhãs o sol espelha
Bate nas lentes escuras
O sangue jorra de esguelha
Na pala das ditaduras

Do Paraguai a Porto Rico
Salvador às Honduras
Da Bolivia à Guatemala

quinta-feira, janeiro 21, 2010

Esclarecer o que nunca existiu com explicações que não explicam nada



A explicação de Fernando Lima é como o computador de Cavaco: tem vulnerabilidades

in: Visão


Três meses depois de ter sido afastado da Casa Civil do Presidente da República por causa do seu envolvimento no chamado caso das escutas, e dois meses depois da sua reintegração na Casa Civil do Presidente da República sem que tivesse havido novidades a propósito do seu envolvimento no chamado caso das escutas, Fernando Lima veio a público explicar o seu envolvimento no chamado caso das escutas dizendo que, tendo embora estado envolvido no chamado caso das escutas, na verdade não teve nada a ver com ele. Ora até que enfim, um esclarecimento claro e cabal sobre este estranho processo.

Primeiro, recorde-se, Fernando Lima tinha arranjado sarilhos falando a um jornal. Agora, quis esclarecer tudo escrevendo para um jornal. Não pode dizer-se que tenha aprendido a lição. Sobretudo porque a explicação de Lima é como o computador de Cavaco: tem vulnerabilidades. O ex-assessor de Cavaco e actual assessor de Cavaco diz que o caso foi empolado pelos jornais a partir de um desabafo vago e inofensivo. "Como é que elementos do PS", terá perguntado Lima inocentemente, "sabem o que faz cada um na vida privada? Andam a vigiar os assessores, quem sabe através de escutas instaladas na residência oficial do Presidente, na sequência aliás de um caso em que, ao que suspeitamos todos aqui na Casa Civil, um assessor do governo foi espiar o Presidente para a Madeira?" A partir destas simples declarações, os jornalistas, com a capacidade de efabulação que se lhes conhece, conseguiram supor que o assessor da presidência desconfiava da existência de escutas na residência oficial do Presidente, e acreditava num caso anterior de espionagem do governo a Cavaco Silva. Tudo não passou, portanto, de uma fantasia inventada pela imprensa. Para Fernando Lima, o Público esteve mal em todo este processo. O DN, revelando o modo como o Público esteve mal, esteve ainda pior. E o Expresso, que agora publicou o esclarecimento de Lima, não perde pela demora. É óbvio que também não se terá portado bem.

Em resumo, a Presidência nunca teve suspeitas gravíssimas de estar a ser vigiada, mas à cautela o Presidente mandou examinar as suas comunicações. A hipótese de vigilância aos assessores de Cavaco não passou de um desabafo que não era para ser tomado à letra, mas de facto o computador do Presidente tinha vulnerabilidades. Falar no caso na altura foi um modo de desviar as atenções dos problemas graves que o país atravessava, mas falar no assunto agora é apropriado, até porque o país já se livrou dos problemas graves que atravessava. Estava a ver que nunca mais se esclarecia isto.

sexta-feira, janeiro 15, 2010

Mas em ti...

És amante em part-time
E amiga a tempo inteiro
O peso que carregas às costas
É o que está na moda
Não vejo o que todos
Conseguem ver nos outros
Mas em ti…

Sou eu a igreja
E o tu, o campanário
Até que somos giros
P’ra dois entes feios
Não vejo o que todos
Conseguem ver nos outros
Mas em ti…

Ambos temos porreiros
Ataques de fúria
Eu quero mais admiradores
Tu queres mais palco
Não vejo o que todos
Conseguem ver nos outros
Mas em ti…

Tentas sempre
Portar-te à tua altura
E eu gosto da forma
Qu’tens de sentir
Não vejo o que todos
Conseguem ver nos outros
Mas em ti…

Beijo-te na testa
Afastados da festa
Vejo estrelas ao beijar-te
Tudo o meu corpo se parte
Não vejo o que todos
Conseguem ver nos outros
Mas em ti…

As pedras perdoam-me
As árvores perdoam-me
Porque não me perdoas tu?
Não vejo o que todos
Conseguem ver nos outros
Mas em ti…

Não vejo o que todos
Conseguem ver nos outros
Mas em ti…




In Juno
A normalidade não quer nada connosco

Angra do Heroísmo


quinta-feira, janeiro 14, 2010

O Partido Impopular Monárquico



O país está numa situação delicada. Todos devemos contribuir com propostas

in: Visão


No ano em que se comemora o centenário da República, o Partido Popular Monárquico quer propor um referendo para saber se os portugueses preferem a monarquia. É um bocadinho como ir a um congresso de vegetarianos perguntar se alguém quer uma posta mirandesa, mas os 15 090 votos que o partido obteve nas últimas eleições legislativas terão feito germinar nos seus dirigentes a forte suspeita de que há uma grande vaga de fundo na sociedade portuguesa a favor da causa monárquica. É natural, são números que impressionam. Os monárquicos dizem que nunca ninguém perguntou aos portugueses se queriam viver num regime republicano, pelo que faz sentido referendar a questão - até por razões de equidade relativamente àquele referendo, em 1143, no qual os portugueses foram chamados a dizer se queriam viver 750 anos num regime monárquico.

Por mim, apoio o referendo. Sendo republicano, tenho admiração pelos monárquicos. Gente que não quer uma figura decorativa eleita por todos e exige uma figura ainda mais decorativa que recebe o cargo de herança. A diferença é tão subtil que é forçoso admirar quem se bate por ela. Além do mais, a monarquia é o regime ideal para todos os que já perceberam que Portugal não irá a lado nenhum enquanto for dirigido por portugueses. Nesse aspecto, a monarquia, no seu fulgurante antipatriotismo, é mais lúcida: a família real inglesa é de origem alemã e dinamarquesa, o príncipe espanhol tem ascendência grega. É muito raro que o rei de determinado país seja aquilo a que se pode chamar um natural desse país. Seria a nossa esperança, se o rei mandasse alguma coisa.

Conseguirá o PPM convocar o referendo? Infelizmente, é pouco provável. É curioso que um partido que se chama "popular" tenha uma falta de popularidade tão grande. Os 0,27% de votos que obteve ficaram muito longe de partidos como o PS ou o PSD, mas também bastante distantes dos votos nulos, com 1,37%, e dos votos brancos, com 1,74%. Há seis vezes mais portugueses que preferem não votar em ninguém do que eleitores do partido monárquico. Mesmo admitindo que o programa político dos votos brancos faz mais sentido, ainda assim é uma diferença muito grande.

Há que admirar, acima de tudo, o esforço dos monárquicos. O país está numa situação delicada, a crise agrava-se, o desemprego sobe, o endividamento aumenta. Todos devemos contribuir com propostas. Há quem defenda que o país precisa de mais investimento público, quem pense que o país precisa de uma política mais austera. Os monárquicos acham que o país precisa de D. Duarte. São opiniões. Creio, por isso, que esta proposta do referendo é o maior contributo do PPM para a política portuguesa desde o comunicado que o partido emitiu logo após a morte de Sousa Franco, na campanha eleitoral das eleições europeias de 2004. Era um comunicado que dizia, e cito: "Não queremos nem devemos dramatizar, nem tão-pouco fazer do Professor um mártir, mas a verdade é que o Professor também deveria fazer parte das pessoas que não cuidava da sua saúde. Provavelmente, não media a tensão há muito tempo. A sua morte já estava prevista." E concluía: "Ao mesmo tempo, estamos certos, esta foi a melhor e a mais eficiente forma de o Professor dizer basta desta politiquice e dos politiqueiros que a alimentam." Talvez um dia Portugal volte a ser uma monarquia. Mas espero sinceramente que isso aconteça apenas muito depois de eu já ter dito basta desta politiquice.

sexta-feira, janeiro 08, 2010

Talvez Foder

Há bombas em Belfast e em Beirute
É preciso afinar o azimute

E eu e tu o que é que temos que Fazer?
(Talvez Foder)
(Talvez Foder)
E tu e eu o que é que temos que Fazer?
(Talvez Foder)
(Talvez Foder)

Há mortos na Palestina
E há feridos em Israel
Conversações que não saem do papel

E eu e tu o que é que temos que Fazer?
(Talvez Foder)
(Talvez Foder)
E tu e eu o que é que temos que Fazer?
(Talvez Foder)
(Talvez Foder)

Porque o que eu quero é
O teu corpo e o teu sexo
Porque o que eu quero é
O teu corpo e o teu sexo
Porque o que eu quero é
O teu corpo e o teu sexo
Porque o que eu quero é
O teu corpo e o teu sexo

Há snipers em Sarajevo
E há fome em Bombaim
Guerra civil sem vergonha nem Fim

E eu e tu o que é que temos que Fazer?
(Talvez Foder)
(Talvez Foder)
E tu e eu o que é que temos que Fazer?
(Talvez Foder)
(Talvez Foder)

Há fascistas em Berlim e em Moscovo
É o discurso que de velho se faz novo

E eu e tu o que é que temos que Fazer?
(Talvez Foder)
(Talvez Foder)
E tu e eu o que é que temos que Fazer?
(Talvez Foder)
(Talvez Foder)

Porque o que eu quero é
O teu corpo e o teu sexo
Porque o que eu quero é
O teu corpo e o teu sexo
Porque o que eu quero é
O teu corpo e o teu sexo
Porque o que eu quero é
O teu corpo e o teu sexo

E eu e tu o que é que temos que Fazer?
(Talvez Foder)
(Talvez Foder)
E tu e eu o que é que temos que Fazer?
(Talvez Foder)
(Talvez Foder)

...

E eu e tu o que é que temos que Fazer?
(Talvez Foder)
(Talvez Foder)
E tu e eu o que é que temos que Fazer?
(Talvez Foder)
(Talvez Foder)

E eu e tu o que é que temos que Fazer?
(Talvez Foder)
(Talvez Foder)
E tu e eu o que é que temos que Fazer?
(Talvez Foder)
(Talvez Foder)

E nós todos o que é que temos que Fazer?
(Talvez Foder)
(Talvez Foder)