quinta-feira, janeiro 29, 2009

Os casos Freeport

Ricardo Araújo Pereira
in, Visão


Que dizer do caso Freeport que ainda não tenha sido referido por outros? Eis um problema que não afecta este vosso amigo. Vasco Pulido Valente, Pacheco Pereira e eu temos a mesma sorte: acontece com muita frequência os cronistas que nos precedem falharem o essencial. Entretêm-se com o supérfluo, esmiúçam os aspectos menos importantes dos assuntos e deixam, livre de toda a palha, o núcleo essencial dos problemas à mercê de ser colhido por nós. Foi o que sucedeu com o caso Freeport. Analistas atrás de analistas têm vindo a ignorar o facto central de todo este processo: Sócrates diz Freepor. Este é o primeiro ponto essencial que ninguém referiu. Toda a gente diz Freeport, menos José Sócrates, que diz Freepor. Parece claro, por isso, que Sócrates recusa revelar tudo neste caso, nomeadamente o t final de Freeport, que nunca articula. Parece impossível que um político que tanto se tem batido pelo ensino do inglês não seja capaz de pronunciar correctamente uma palavra inglesa. Portugal assiste, portanto, a dois casos em vez de um: o caso Freeport e o caso Freepor. Este último – que, recordemos, foi denunciado por mim –, acaba por ser mais rico e intrigante do que o primeiro, porquanto junta às suspeitas de corrupção o mistério do desaparecimento de uma consoante. Além disso, entronca num caso antigo, na medida em que recupera as dúvidas que existiam quanto às competências do primeiro-ministro no âmbito do inglês técnico.

O segundo ponto essencial que a imprensa tem esquecido é o motivo. Sócrates tinha ou não uma razão forte e privada para favorecer a construção do Freeport? Não é preciso pensar muito para concluir que sim. A quem interessa um outlet com lojas de roupa de marca mais barata perto de Lisboa? Ao sexto homem mais elegante do mundo, certamente. O Freeport permite-lhe manter a mesma elegância, mas a preços mais baixos. Não sei se o primeiro-ministro cometeu alguma infracção ética ou até algum delito no caso Freeport, mas não deve ser menosprezada a ambição, inerente à condição humana, de ultrapassar o Karl Lagerfeld em garbo.

O terceiro ponto menosprezado pela comunicação social tem a ver com o facto que precipitou a investigação. Ao que parece, o juiz desconfiou do modo como o projecto foi licenciado. De acordo com a descrição do magistrado, tudo se passou de forma impecável, célere e competente. Estava à vista de todos que alguma coisa estava mal. Em Portugal, este costuma ser um bom método para descobrir ilegalidades. Se um projecto é aprovado dentro do prazo, alguém anda a receber dinheiro por fora. Normalmente, quando alguma coisa corre bem, é sinal de que há moscambilha.

segunda-feira, janeiro 19, 2009

3 minutos antes de a maré encher - parte 4



3 minutos antes de a maré encher - parte 3



3 minutos antes de a maré encher - parte 2



3 minutos antes de a maré encher - parte 1



monotone



Morreu João Aguardela



sexta-feira, janeiro 16, 2009

terça-feira, janeiro 13, 2009

Maddie encontrada sã e salva


O mundo acordou esta terça-feira estupefacto: a menina inglesa que havia desaparecido na Praia da Luz, Lagos, a 3 de Maio de 2007, foi resgatada com vida e aparentemente de boa saúde por uma equipa das forças especiais do exército egípcio, que desmantelou uma rede internacional de tráfico humano. Maddie foi apenas uma das 50 pessoas – entre crianças e mulheres mais velhas – resgatadas pelas autoridades, numa propriedade situada nos arredores do Cairo, onde aquela organização mantinha em cativeiro as pessoas que sequestrava pela Europa fora, com o fim de as colocar na rota da prostituição e/ou tráfico de órgãos. Avisada com a antecedência necessária, a Sky News transmitiu em directo a libertação de Maddie. Logo depois, a entidade britânica de protecção a menores interpôs uma providência cautelar no Supremo Tribunal do Reino Unido para impedir a divulgação de imagens da criança pelos tablóides e pelas televisões.

O casal McCann deslocou-se expressamente ao Cairo, tendo sido muito notada a ausência de lágrimas por parte da mãe, Kate McCann. Fontes da Polícia Judiciária portuguesa declararam à VISÃO que este desfecho não convence absolutamente nada a polícia portuguesa, que já solicitou, aliás, a vinda dos McCann a Portugal, para prestarem declarações. Entretanto, o ex-inspector Gonçalo Amaral anunciou estar já a preparar um novo livro: Maddie, a sequela.

O Papa Bento XVI rezou pela família McCann, no Vaticano e José Sócrates já enviou uma mensagem de felicitações ao seu homólogo britânico, Gordon Brown, terminando o telegrama com um entusiasmado Cool, man!

Retirado da Visão Online
Textos baseados em ideias expressas pela redacção da VISÃO. Depoimentos recolhidos por Francisco Galope, João Paulo Vieira, Pedro Vieira, Sylvie Oliveira, Teresa Campos e Tiago Fernandes.

quinta-feira, janeiro 08, 2009

É que eu quero-te tanto

Mafalda Veiga
in, Chão

Por mais que a vida nos agarre assim
Nos troque planos sem sequer pedir
Sem perguntar a que é que tem direito
Sem lhe importar o que nos faz sentir
Eu sei que ainda somos imortais
Se nos olhamos tão fundo de frente
Se o meu caminho for para onde vais
A encher de luz os meus lugares ausentes

É que eu quero-te tanto
Não saberia não te ter
É que eu quero-te tanto
É sempre mais do que eu te sei dizer
Mil vezes mais do que eu te sei dizer

Por mais que a vida nos agarre assim
Nos dê em troca do que nos roubou
Às vezes fogo e mar, loucura e chão
Às vezes só a cinza do que sobrou
Eu sei que ainda somos muito mais
Se nos olhamos tão fundo de frente
Se a minha vida for por onde vais
A encher de luz os meus lugares ausentes

É que eu quero-te tanto
Não saberia não te ter
É que eu quero-te tanto
É sempre mais do que eu sei te dizer
Mil vezes mais do que eu te sei dizer

Espelho

Para si que faz da acção um modo de vi
O homem de sucesso não dispen
Se o preocupa o futuro dos fi
Previna-se da morte e da doen

Se pensa trocar o seu automó
Ter o único dentíficro anticá
Não queira ser um cidadão anó
Reserve já o novo semaná

Tu és o que compras
Pagaste o que és
Para te veres ao espelho
Ligas à TV

Prisão em Si

E numa prisão em si
Não saindo do que é seu
Foi esquecido
Adormeceu

À procura do amanhã
Andam homens inseguros
Erguem escadas
Partem muros

A nós os montes imundos
Dêem-nos os vales profundos
Sítios onde é impossível ir
Ergam escadas
Partam muros
Ergam escadas...

Muros de Palavras

Manuel António Pina
in, JN


Há uns anos, numa reportagem de "A Capital" sobre meninos da rua, um rapaz de 8 anos lamentava-se ao repórter: "A minha mãe fecha-me fora de casa". Conto muitas vezes esta história, bem como aquela do internado num hospício que, através das grades, diz para um passante: "Há muitos aí dentro?" Os muros, as grades, as portas fechadas prendem- -nos a todos.

Não criam "foras", multiplicam "dentros". E os muros mais difíceis de atravessar são os das palavras e das ideias. O que mais se tem visto e lido em relação ao actual conflito em Gaza são atitudes entrincheiradas atrás de muros de palavras e ideias, incapazes de vislumbrar no "outro" uma réstia de motivo ou humanidade. Ora, como escreve Nietzsche, julgo que no "Zaratustra", "tu, vítima, não penses que não tens culpa; e tu, carrasco, não penses que não sofres". É fácil ter ideias claras e a preto e branco sobre o que se passa em Gaza sentado diante da TV, vendo o que se quer ver e fechando os olhos ao resto. Os israelitas e palestinianos comuns (pois há israelitas e palestinianos comuns) são forçados há meio século a ver o que não querem ver.

segunda-feira, janeiro 05, 2009

Circunspecção de mau gosto

Não posso estar mais de acordo com o Ricardo!

Guilherme Rietsch Monteiro

Ricardo Araújo Pereira
in, Visão

Julgo que a opinião da directora da DREN, Margarida Moreira, segundo a qual a ameaça a uma professora com uma arma de plástico foi uma brincadeira de mau gosto, é uma brincadeira de mau gosto. Mais uma vez se prova que a crítica de cinema é extremamente subjectiva. Eu também vi o filme no YouTube e não dei pela brincadeira de mau gosto. Vi dois ou três encapuzados rodearem uma professora e, enquanto um ergue os punhos e saltita junto dela, imitando um pugilista em combate, outro aponta-lhe uma arma e pergunta: «E agora, vai dar-me positiva ou não?» Na qualidade de apreciador de brincadeiras de mau gosto, fiquei bastante desapontado por não ter detectado esta antes da ajuda de Margarida Moreira.
Vejo-me então forçado a dizer, em defesa das brincadeiras de mau gosto, que, no meu entendimento, as brincadeiras de mau gosto têm duas características encantadoras: primeiro, são brincadeiras; segundo, são de mau gosto. Brincar é saudável, e o mau gosto tem sido muito subvalorizado. No entanto, aquilo que o filme captado na escola do Cerco mostra aproxima-se mais do crime do que da brincadeira. E os crimes, pensava eu, não são de bom-gosto nem de mau gosto. Para mim, estavam um pouco para além disso – o que é, aliás, uma das características encantadoras dos crimes. Se, como diz Margarida Moreira, o que se vê no vídeo se enquadra no âmbito da brincadeira de mau gosto, creio que acaba de se abrir todo um novo domínio de actividade para milhares de brincalhões que, até hoje, estavam convencidos, tal como eu, que o resultado de uma brincadeira é ligeiramente diferente do efeito que puxar de uma arma, mesmo falsa, no Bairro do Cerco, produz.
O mais interessante é que Margarida Moreira, a mesma que agora vê uma brincadeira de mau gosto no que mais parece ser um delito, é a mesma que viu um delito no que mais parecia ser uma brincadeira de mau gosto. Trata-se da mesma directora que suspendeu o professor Fernando Charrua por, numa conversa privada, ele ter feito um comentário desagradável, ou até insultuoso, sobre o primeiro-ministro. Ora, eu não me dou com ninguém que tenha apontado uma arma de plástico a um professor, mas quase toda a gente que conheço já fez comentários desagradáveis, ou até insultuosos, sobre o primeiro-ministro. Se os primeiros são os brincalhões e os segundos os delinquentes, está claro que preciso de arranjar urgentemente novos amigos.

Feliz 2010!



Casa Pia



Salvem os ricos