quinta-feira, julho 30, 2009

Cavaleiro Andante

Porque sou o cavaleiro andante
Que mora no teu livro de aventuras
Podes vir chorar no meu peito
As mágoas e as desventuras

Sempre que o vento te ralhe
E a chuva de maio te molhe
Sempre que o teu barco encalhe
E a vida passe e não te olhe

Porque sou o cavaleiro andante
Que o teu velho medo inventou
Podes vir chorar no meu peito
Pois sabes sempre onde estou

Sempre que a rádio diga
Que a américa roubou a lua
Ou que um louco te persiga
E te chame nomes na rua

Porque sou o que chega e conta
Mentiras que te fazem feliz
E tu vibras com histórias
De viagens que eu nunca fiz

Podes vir chorar no meu peito
Longe de tudo o que é mau
Que eu vou estar sempre ao teu lado
No meu cavalo de pau

Apresentação do programa do Bloco de Esquerda







Incentivos



Gripe AJJ



Os socialistas estão a tentar convencer os eleitores de que as pessoas de esquerda são do PS, e Manuela Ferreira Leite está a ver se ninguém repara que Alberto João Jardim é do PSD

in: Visão


O leitor mais perspicaz já terá percebido a relação próxima que existe entre as listas do PS com candidatos de esquerda e o Hindenburg da Madeira, o zeppelin do PND que levou tiros de caçadeira em Chão da Lagoa. Infelizmente, porém, só uma pequena parte dos meus leitores é perspicaz - de outro modo, não seriam meus leitores. E é por isso que, por muito fastidioso que isso possa ser para os meus leitores mais perspicazes, me vejo obrigado a explicar aos menos perspicazes a razão pela qual as listas do PS e o zeppelin da Madeira são factos que devem ser analisados em conjunto.

Eu resumo os factos: Manuela Ferreira Leite contraiu uma conveniente gripe, e por isso ficou impedida de ir à ilha em que a propaganda dos partidos da oposição é abatida a tiro. Os assessores da presidente do PSD esclareceram que ela não sofria de gripe A, mas parece evidente que estamos perante um caso de gripe AJJ. Aos sintomas da gripe, junta uma espécie de alergia a Alberto João Jardim, que também é muito incomodativa. Quanto ao PS, está a formar listas de candidatos à Assembleia da República com gente que não é do PS. Ou seja, os socialistas estão a tentar convencer os eleitores de que as pessoas de esquerda são do PS, e Manuela Ferreira Leite está a ver se ninguém repara que Alberto João Jardim é do PSD.

A tarefa de Manuela Ferreira Leite será, provavelmente, mais difícil. Sobretudo porque tem sido tentada por quase todos os presidentes do PSD, sempre sem grande sucesso. Já a tarefa do PS, é sazonal. A mais curiosa característica do PS será, talvez, esta: quando está na oposição é um partido de esquerda, quando está no governo transforma-se no PSD. Habitualmente, por isso, a escolha dos eleitores faz-se entre o PSD normal e o PSD do Largo do Rato.

A estratégia do PS é interessante sobretudo porquanto dificulta o trabalho do PSD: quando estão no governo, os sociais-democratas enfrentam um opositor feroz que considera vergonhosas as suas políticas; quando está na oposição, o PSD tem de inventar discordâncias com um governo que é extremamente parecido com o seu.

O problema das listas do PS é que parecem desenhadas para compor a bancada socialista quando está na oposição. É verdade que, somados, os partidos à esquerda no PS tiveram, nas últimas eleições, mais de 20% dos votos, e é natural que os socialistas queiram recuperar alguns desses eleitores. Mas, na eventualidade mais ou menos remota de o PS ganhar as legislativas, terá a bancada parlamentar minada por gente que não costuma apoiar o PSD do Largo do Rato. Um putativo governo do PS terá maioria nas urnas, mas não no seu grupo parlamentar. Lá divertido vai ser.

Zeca Afonso: 'Sou um homem comum?

in Visão

Publicada, em 1970, no Cena 7



Daniel Ricardo e Cáceres Monteiro



Estava frio. Por isso, naquela esplanada de Setúbal onde nos encontrávamos, havia pouca gente. "Sou incapaz de funcionar sem engolir um café" - disse-nos José Afonso, com as mãos nos bolsos da gabardina, um ar sonolento. Alguns minutos depois, a promessa cumpria-se. Já desperto, retemperado pela bebida e, afinal, pelo sol que começava a aquecer, José Afonso respondia, abertamente, a todas as nossas perguntas.
- Não tenho um padrão crítico seguro de um especialista em música que me diga se aquilo que faço é uma droga ou uma coisa de relativa qualidade - assim procurou ele situar o valor da sua obra, "o valor daquilo para que fui arrastado".
E que razões o levaram a escolher o caminho pelo qual enveredou?
- Para explicar isso, é necessário regressar aos tempos de estudante, em Coimbra. Eu cantava, então, fados e, algumas vezes, toadas vagamente populares da região.
Com o tempo, José Afonso apercebeu-se de um certo anquilosamento formal do fado de Coimbra, tanto quanto ao aspecto temático como quanto à parte musical:
- Quando se cantava o fado de Coimbra, construía-se um determinado "décor", um estudante de capa e batina, os dois acompanhantes... As serenatas convencionais, com todo este cenário, começaram a parecer-me um pouco artificiais - precisa. E prossegue: "Se o cenário era artificial, o que eu cantava também o era. Pensei, pois, que essas canções tinham de se alargar, de se movimentar mais."
Sobretudo, teriam de se radicar, pensou o cantor, em coisas mais profundas do que um simples "folcore de casta". Embora haja quem pense que só os estudantes cantam o fado de Coimbra, isso não corresponde à verdade: com o tempo, aquele género musical passou a ser cantado também pelas pessoas que vivem na órbita dos estudantes.
- De qualquer maneira, surgiu em mim uma espécie de insatisfação em relação a essas formas tradicionais, a qual coincidiu, aliás, com uma certa evolução mental.
Ao historiarem a vida associativa na sua Universidade, os actuais estudantes de Coimbra costumam referir-se a uma "primeira fase folclórico-fadista". Terá o fado coimbrão permanecido nessa fase da vida associativa, resultando daí o referido anquilosamento temático e formal?

Duas forças
José Afonso crê que a asserção não é exacta porque, segundo afirma, a atitude conservadora, que se expressa num determinado folclore, musical e poético, nem sempre coexistiu pacificamente, em Coimbra, com uma atitude "progressista". Essas duas forças ("uma convencional, com a sensibilidade à flor da pele, que se exprimia em formas anquilosadas, e outra mais agressiva e ambiciosa, que procurava colocar os esquemas da vida associativa a par das ideias de certos meios do exterior") - essas duas forças sempre se digladiaram.
José Afonso pensa que os actuais intérpretes do fado de Coimbra se limitam a apresentar composições do tempo de Paradela de Oliveira ou mesmo dos cantores clássicos. No entanto, não reivindica, para si, um lugar de inovador. Afirma que já existia uma série de estímulos anteriores, que excediam o âmbito do folclore de casta. E recorda Edmundo Bettencourt, hoje esquecido, que foi um cantor muito importante em Coimbra, um elemento vivificador. Como sublinha o autor de "Os Vampiros", Bettencourt introduziu temas de canções populares beirãs e açorianas no repertório coimbrão. O próprio José Afonso sentiu a sua influência, que se reflecte na "Canção da Saudadinha" e nas canções da Beira Baixa, por exemplo, e lembra também Rogério Boavida como um dos cantores que procuram ultrapassar o âmbito restrito do fado de Coimbra. Conhecedor dos interesses criados em públicos que não integram, apenas, as massas estudantis tradicionais, José Afonso foi alterando e renovando os antigos temas musicais. Infringiu, em suma, certas formas ingénuas de fazer música.
- Hoje estou num beco sem saída, não sei para que lado me hei-de virar, porque sou um ignorante em matéria de técnica musical, e a partir de um determinado grau de responsabilidade já é necessário não fazer as coisas em cima do joelho.
José Afonso atravessa "uma fase de cepticismo quanto à função da canção como processo de despertar consciências". Segundo afirma, "há meios em que a canção se revela um modo salutar, simples e directo de estabelecer uma convivência construtiva, de contribuir para uma melhoria das relações humanas". Não consegue, porém, "sugerir um tipo de coisas mais profundas".
- A canção, hoje em dia, é um pouco masturbativa: é um processo em que sai o tiro pela culatra. As pessoas começam a classificar as letras, a dividir os textos para verem se são ou não válidos. Às tantas, o cantor fica metido num beco sem saída. Além disso, as pessoas que ouvem as canções utilizam-nas como salvaguarda das suas próprias consciências, transferem os seus problemas e responsabilidades para o cantor, que se limita, como cantor de "music-hall", a ser um bem de consumo. Com a agravante de que um cantor integrado num meio profissional de "music-hall", além de ser um bem de consumo, transforma-se num alibi de consciências.
O importante, segundo José Afonso, é que se faça música de qualidade, incidindo, inclusivamente, nos temas tradicionais, líricos ou amorosos, desde que esses temas sejam, efectivamente, tratados de uma forma digna.
- Há quem pense que a arte de determinado tipo é aquela que vive de slogans considerados, aprioristicamente, possuidores de certo conteúdo político. Ora, eu penso que o tema amoroso, como qualquer outro, pode ser tratado numa perspectiva objectivamente interessante. A arte panfletária não é, necessariamente, revolucionária. Há muita gente que ignora que nós não temos arte directamente contestatária. Folheando os nossos romanceiros, os nossos cancioneiros, não se encontram canções que ponham em questão uma dada estrutura político-social. Nem sequer as canções de escárnio e maldizer. Dentro do nosso património cultural popular, existe uma aceitação implícita das estruturas vigentes. Quando se fala de arte popular e se pretende que um cantor traduza, de uma forma quase dialéctica, em termos precisos, uma situação social, e proponha, através da sua canção, um plano, eu penso que se está a pôr o carro adiante dos bois. Antes das canções, há muita coisa a fazer. Os indivíduos que afirmam que a canção de protesto foi recuperada, pensam que as canções são "engagés" quando, afinal, as pessoas (o cantor e o público) é que são "engagés".

Cantar para quem?
Em sua opinião, existindo uma comunidade de pontos de vista entre o público e o cantor, aquilo que a canção representa está para além do seu próprio conteúdo formal, reside na capacidade de as pessoas mutuamente se movimentarem, servindo-se de um pretexto.
- Poderá parecer pretensioso, mas, efectivamente, eu gostaria de cantar para as pessoas para quem a canção possa representar alguma coisa. Mas isso não é possível, porque, se eu fosse cantar para o ambiente em que vivem, como, aliás, já tenho feito, essa minha interferência, essa minha irrupção soaria como um acto de paternalismo. Isso sucederia até porque a minha presença não seria contínua.
O cantor procura acender um cigarro mas o isqueiro falha várias vezes. Ele não perde, porém, o fio à meada:
- Qual é a música que tem audiência junto dessas pessoas? A do conjunto da Maria Albertina e não as composições do ilustre Zeca Afonso ou outro do estilo.
José Afonso gostaria, evidentemente, que essa situação se modificasse e que a sua acção e a de muitos outros cantores fizesse com que as pessoas, tempo e elementos "inter-franqueassem" distâncias e o público ficasse em condições de aceitar as canções que interpreta, ou de as criticar, ou, ainda, de as ultrapassar, considerando-as um subproduto em relação às próprias exigências.
Há quem afirme que a obra de José Afonso tem evoluído e que as preocupações de antigamente cederam o lugar a temas mais livres...
- Tenho sempre dificuldade em rememorar fases e também uma certa aversão pela canção de conteúdo directo, que pretende sintetizar as mais diversas situações de uma forma esquemática. Isso parece-me um bocado didáctico.
Ele não pretende transmitir conhecimentos; quer, apenas, utilizar as formas de sensibilidade existentes, aproveitá-las para conquistar a adesão dos ouvintes. Segundo o cantor, verificou-se uma deformação do gosto do público e desapareceu a verdadeira canção popular ou, pelo menos, aquilo que nós imaginamos que seja o folclore - testemunho de certo modo de vida.
- As pessoas estão contaminadas por um gosto que lhes é fornecido, que lhes é imposto, e fixa, na verdade, as preferências da maioria. Torna-se urgente reagir, contribuir para uma higienização desse gosto.
José Afonso chegou, porém, à conclusão de que, neste particular, as canções puramente líricas "são um pouco impotentes".
Deste conjunto de preocupações nasceram, por exemplo, "Pombas" e "Trovas Antigas", canções simples, com letras simples, canções de roda, e outras, com temas mais directos.
- Muitas canções foram, todavia, feitas por motivos quase subjectivos, testemunhos de situações que eu vivi, intensas sob o ponto de vista vivencial... - disse-nos, quando lhe falámos de "Senhor Poeta".
Quais os critérios fundamentais que determinam a escolha dos temas de José Afonso? Que influências se revelam nas suas composições?
- Em geral, não subordino, até por impotência, por incapacidade de meios, por desconhecimento da música e por outras insuficiências resultantes da minha própria formação, não subordino a música a determinados temas, textuais ou musicais - explica-nos.
As canções surgem como relações quase autobiográficas. José Afonso afirma que aquilo que lhe ocorre, fundamentalmente, é a música, certos fragmentos musicais. São, por vezes, repetições, plágios inconscientes, que "apanha no ar, com facilidade". Depois, vão surgindo as palavras, enche as frases musicais de palavras, e vai-as distribuindo, subordinando-as às exigências do ritmo.
- Mas eu componho puramente de ouvido - confessa, sorrindo - Quando falo de composição fico atrapalhado...

Um certo tipo de alienação
Pouco a pouco, a esplanada enchia-se. O sol aquecera um pouco a manhã difusa. Aproximou-se um homem com uma caixa de pensos para curativos. José Afonso depositou uma moeda na tampa e tirou um penso. "Tire mais" - insistiu o homem. "Não, este é suficiente", respondeu o poeta.
Do outro lado da avenida chegava, cadenciado, o som monótono do rufar dos tambores dos soldados de um quartel.
Já se pôs a José Afonso o problema de se profissionalizar na música. Presentemente, está um pouco ligado ao disco, pois tem por missão fazer "umas tantas canções para uns tantos LPs, em determinado espaço de tempo".
- Diz-se, em certos meios, que o sr. Arnaldo Trindade [ver "Andanças do Andarilho"], pode vir a representar uma alienação... - sugerimos. Tranquilamente, José Afonso pergunta:
- Mas alienação porquê? Por abastardar a qualidade daquilo que faço ou por me prejudicar como homem?
- Foi em relação ao abastardamento da qualidade que se levantou a questão, sobretudo na medida em que da referida ligação resultariam compromissos que obviariam a que continue aquilo que tem feito até agora...
O cantor ficou em silêncio, por momentos. Depois disse:
- Não sei, veremos... Suponho, porém, que aquilo que está na forja é melhor do que aquilo que tenho feito. É muito cedo, ainda, porque há pouco tempo que assinei o contrato com o Arnaldo Trindade. Por razões de ordem fisiológica, ou canto ou dedico-me à pesquisa, no campo musical. Precisava, portanto, de um mínimo de profissionalização, de receber um ordenado para apresentar trabalho. Não sei se isso contribuirá para uma perda de qualidade ou se essa perda de qualidade virá a ser motivada pelo meu desconhecimento de música.
José Afonso afirma que as pessoas fazem uma ideia muito romântica acerca do que seja produzir qualquer coisa que esteja dependente da sensibilidade.
- A canção é um produto como os outros e para que se apresente nas melhores condições é preciso que haja uma certa disponibilidade de tempo que eu não teria se continuasse no ensino, enterrado até às orelhas dentro do magistério e preocupado com outras obrigações parcelares.
A actividade de professor do liceu que desempenhou teve influência na sua música:
- Durante o tempo em que ensinei no ciclo preparatório, conheci um tipo de relações de uma pureza impossível, pelo menos, entre nós, pessoas adultas.
Isso influiu poderosamente na produção de canções representativas como o "Menino de Oiro", o "Menino do Bairro Negro" e "Altos Castelos".
Algumas vezes (assim aconteceu em Moçambique, na Beira) a música serviu-lhe para complementar o ensino. Mas, de um modo geral, os alunos não "exigiam" que ele cantasse. Só por brincadeira.
- De qualquer modo, as próprias relações entre mestres e discípulos, quanto a mim erradas, fazem com que o aluno encare o professor como o "senhor professor", aquele que tem por missão pôr os riscos vermelhos nos pontos e ensinar a matéria. As relações entre o professor e o aluno, dentro de uma aula, no seio da rotina escolar, impedem que o jovem veja o mestre para além dessas limitações. No meu caso, não pude ultrapassar a situação, talvez por impotência ou deficiência de formação profissional... - diz-nos José Afonso.
Os operários, mais do que qualquer outro grupo, com o seu agudo sentido de fraternidade, exerceram, igualmente, uma influência sensível no cantor. Ele explica:
- Não foram particularmente estimulantes, no aspecto da criação. Se eu não tivesse convivido com operários, ver-me-ia obrigado a pôr em questão a função daquilo que canto. Acontece que a culpa não é dos operários mas, sim, minha. Não procuro iludir a minha origem burguesa, a minha experiência de estudante, embora esta tenha sido relativamente larga, devido a factores mais ou menos acidentais, como a possibilidade de estabelecer contacto com pessoas situadas fora do âmbito universitário.
Esse contacto não foi, conforme sublinha, determinado por nenhuma tomada de consciência, mas pelas circunstâncias especiais em que viveu em Coimbra:
- Convivi muito com sociedades de bailaricos. O Flávio Rodrigues era o meu acompanhador predilecto e eu fazia muitos passeios, ia cantar a catequeses, e se não era a catequeses era a outro sítio qualquer (aliás, eu não distinguia entre cantar para catequeses e cantar para bailaricos). E tudo isto e uma forma bastante anárquica de vida, em Coimbra, em torno da minha condição de estudante, é que me forneceram uma enorme diversidade de experiências. Para mim, foi proveitoso e estimulante da criação andar às boleias, não ter dinheiro, precisar de usar estratagemas para vencer algumas situações. Hoje, tudo isso está ultrapassado. Surgiu uma geração que racionaliza muito o seu comportamento num determinado sentido, como eu nunca fiz; e todas as minhas recordações começam a ser inúteis...

Atafulhado no ensino
A passagem de José Afonso por Moçambique revelou-se, também, "proveitosa, designadamente do ponto de vista musical"; o ritmo que está sempre na base das manifestações musicais dos africanos, impressionou-o e interessou-se pelo folclore e viu dançar a marrabenta ("Pareceu-me já uma forma degenerada de expressão da arte africana").
Em Moçambique, esteve "atafulhado no ensino". Fez pequenas viagens ao interior, em serviço de exames. Um dia, deslocou-se ao Zobué e cantou para os indígenas.
A posição do africano em face ao mundo do branco continua a impressionar José Afonso:
- Havia nos negros uma atitude contemplativa que nós, brancos, não éramos capazes de ter. O branco vai para África investido numa missão oficial ou profissional. Perante o mundo do branco, o africano tem um comportamento "filosófico", irónico, realmente "contemplativo"...
E o cantor analisa essa "bonomia de relações":
- Tratava-se de uma atitude correcta, cortês...
Dá o exemplo de um acidente de viação. Enquanto os brancos discutem quem pagará as indemnizações, os africanos, contemplam o espectáculo, sorrindo.
Ou então:
- Em Lourenço Marques, a senhora vai às compras e leva o "mainato" no assento de trás do carro. Este acaba por ser o patrão e a patroa o "chauffeur".
A passagem de José Afonso por África reflectiu-se em composições como "Vai Maria vai", que cantou em conjunto com Teresa Paula Brito, e "Era de noite e o levaram". José Afonso acrescenta que gostaria de encher as suas músicas só com instrumentos de percussão, e ir eliminando, pouco a pouco, os preconceitos ligados à melodia, que, segundo afirma, derivam do fado de Coimbra.
Entretanto, admite a possibilidade de ter recebido, ainda, uma (difusa) influência de Joan Baez, cujas composições ouviu, pela primeira vez, em Moçambique. Mas como afirma, ficam-se por aí os pontos de contacto entre as suas canções e a música estrangeira. Na verdade, José Afonso elabora e interpreta de uma forma muito pessoal o seu repertório. Durante os espectáculos em que participa, chega a esquecer-se das letras que ele próprio escreveu e, em geral, é o público que lhe aviva a memória. Uma amnésia provocada pelas condições difíceis que rodearam, em determinado período, a vida do cantor, justifica essas singulares situações a que parece não ser estranho, também, o desprendimento de José Afonso em relação à obra que realizou.
- Talvez exista um certo desprendimento... - concorda o autor de "Trás outro amigo também". E explica: "Encaro tudo por um prisma bastante lúdico. Estou sempre a pensar que, em breve, deixarei de cantar para fazer outra coisa qualquer. De resto, dedico-me à música com menos gosto do que, por exemplo, ao desporto."
José Afonso fala-nos, uma vez mais, da sua experiência de professor:
- Gostei muito de ensinar, mas o ensino não me ofereceu a diversidade de vivências que retiro da minha actividade de cantor. Estou indeciso quanto ao que, efectivamente, prefiro fazer. No fundo, não me desagradaria exercer, alternadamente, as duas profissões: dois anos a ensinar, um ano a cantar...

O movimento das baladas
O diálogo derivou para o chamado movimento das baladas. Há algum tempo, elementos integrantes dessa tendência concluíram ter chegado o momento de fazerem um balanço, e apuraram que o género a que se dedicavam não era, afinal, a "via" procurada. Dos baladeiros que proliferaram durante cerca de três anos no quadro de música ligeira apenas dois ou três sobreviveram. José Afonso possui uma opinião formada acerca do assunto:
- Até à data, nunca se pusera em questão a função da música ligeira. A partir da altura em que surgiram os primeiros cantores do novo movimento, as pessoas começaram a perguntar se estariam perante a "via" certa da canção nacional. Isto demonstra já a importância das baladas. Houve, de resto, uma melhoria sensível da qualidade dos textos. Atribuiu-se, no entanto, demasiado valor aos poemas. Muitas canções viviam mais da letra do que da música. E uma coisa é um poema, outra um texto para ser cantado...
Segundo José Afonso, os baladeiros desenvolveram uma acção colectiva, que não pode deixar de se considerar válida. Apresentaram-se em colectividades onde nunca tinham entrado cantores profissionais e levaram às respectivas massas associativas um pouco de cultura:
- Antes de se tornarem autores, esses cantores eram indivíduos com opiniões e dotados de uma grande vontade de intervir nos acontecimentos. Não buscavam o vedetismo.
E o poeta acrescenta:
- Não se tratava de profissionais. Assim, muitas das canções que produziram parecem-me banais, do ponto de vista musical, já que se baseiam apenas em duas ou três posições à viola. Em todo o caso, conheço alguns cantores que se integram no movimento e possuem inegável valia. Um deles é o José Mário Branco que vive em França. Duvido que exista, entre nós, fora do âmbito das baladas, alguma composição que se compare às que ele realiza.
Tal como os badaleiros, José Afonso também não persegue o vedetismo:
- Não me interessa que me considerem um músico ou uma vedeta. Pelo contrário, estou empenhado em conseguir que se desfaça a impressão de que me tornei uma coisa que deve colocar-se numa redoma. Uma vez que me acusam de ter sido injustamente mitificado, quero afirmar que sou apenas uma pessoa comum. Não contribuí, pelo menos de forma consciente, para que me propusessem como exemplo humano a seguir. Recuso-me, terminantemente, a transformar-me num mito de segunda ordem, ou de que ordem seja; tenho defeitos de diversa natureza, insuficiências, mais do que limitações. Canto, de vez em quando, como poderia fazer judo, jogar futebol ou dedicar-me à literatura policial.
À tarde, após o almoço, passeámos com José Afonso, por Setúbal. Na parte mais antiga da cidade, mostrou-nos, com um entusiasmo espontâneo, recantos, ângulos da paisagem, simples pormenores de edifícios. Caminhava vigorosamente, era quase a custo que acompanhávamos as suas passadas. Numa taberna do cais deteve-se a falar com alguns pescadores que conhecia e engoliu um copo de vinho que lhe ofereceram.
Embora se considere desadaptado em relação ao meio pequeno em que vive, José Afonso procura actuar sobre esse meio, para o modificar, não obstante conheça as dificuldades que tem de enfrentar. Por isso se integrou no Círculo Cultural de Setúbal.
- Tenho poucas relações, em Setúbal, todas elas quase acidentais. Um ou outro empregado de mesa, alguns amigos com preocupações semelhantes às minhas, e pouco mais - diz-nos.
Para José Afonso, Setúbal é uma espécie de "porta-aviões", aonde chega e de onde parte constantemente, foi ali colocado como professor, gostou da cidade e da respectiva situação geográfica e ficou.
- Sou um sujeito que dá os seus passeios ao domingo, e nada mais. Gosto da terra. É cómoda, sob o ponto de vista das relações sociais.
Diz o cantor que, em Setúbal, ninguém o conhece. Em sua opinião as pessoas olham para ele como para outro indivíduo qualquer. Aprecia o campo e a proximidade do mar. O contacto com a natureza é uma coisa que o "enche, de uma maneira particularmente intensa".
- A configuração da região, a Arrábida, umas pistas que há por aqui, permitem que me dedique a formas mais ou menos higiénicas de vida, as quais me dão muita satisfação - diz-nos.
Gosta também de atravessar o Tejo, de ir do Barreiro a Lisboa, de Cacilhas ao Terreiro do Paço, ou de "participar, como normal figurante, numa entrada de um desafio de futebol".
Actualmente, vai poucas vezes ao futebol, porque a paixão clubista, a "beatice futebolística" o irrita. Entende, porém, que o fenómeno da presença das multidões num campo de jogos é perfeitamente explicável.
- Não há que criticar as aglomerações, mas apenas o modo como se comportam e em função de que interesses - acrescenta.
Depois, ressalva:
- Mas não assumo qualquer atitude paternalista relativamente às paixões clubistas.
José Afonso jogou futebol nos juniores da Académica e praticou judo.
- Fui mesmo um viciado no judo e até parti uma perna em dois sítios. Tenciono, aliás, voltar à actividade.
Com 41 anos, o cantor declara-se fisicamente "em forma" e psicologicamente "muito gasto". Lê bastante, embora sem um critério definido, e nunca acaba os livros porque, segundo afirma, "não percebe as histórias":
- Não consigo nunca entender, por exemplo, os romances policiais...
Detesta livros de anedotas, mas dedica-se, frequentemente, à leitura de revistas de informação político-social nacionais e estrangeiras e, pelo fim da tarde, debruça-se sobre os jornais.
- Trago sempre um livro no bolso e faço grandiosos planos de estudo que nunca cumpro.

A frequência de Londres
Recentemente, o cantor gravou um LP em Inglaterra. A propósito, conta que, no primeiro ensaio, efectuado em Lisboa, utilizou diversos instrumentos escolhidos no próprio local da gravação. O padre Fanhais tocou bombo e o José Fortunato veio do Barreiro, propositadamente, para acompanhar o "São Macaio".
- Aquilo que eu tinha em mente era, porém, ir a Inglaterra - acrescenta. E explica: "Estava farto de Setúbal. Queria por força ir a Inglaterra. Como em Portugal as condições técnicas provocaram distorções de voz, o desaparecimento dos graves e dos agudos, etc., decidi recorrer aos estúdios da Pye. Então, seleccionei canções susceptíveis de serem interpretadas com um único acompanhador. Depois, chegaria à conclusão de que muitos dos trechos mereciam melhor tratamento, um suporte musical de qualidade superior.
José Afonso cantou acompanhado por Boris. Rui Pato encontra-se a cumprir serviço militar obrigatório e, consequentemente, não estava disponível para se deslocar a Londres.
- Tenciono voltar a trabalhar com o Rui - diz José Afonso - Ele atira para o clássico, enquanto que o Boris pertence ao tipo "folk".
Na opinião do cantor, as suas composições não são conhecidas em Inglaterra porque existe, naquele país, uma música ligeira muito evoluída, com a qual não pode competir:
- Londres é a capital da "pop-music". Os estilos e as técnicas adoptadas na capital britânica não se comparam com os que cultivamos em Portugal. Mas notei uma reacção muito boa aos meus discos, em França e na Bélgica.
Ao serviço de Arnaldo Trindade, José Afonso percorrerá o País, em busca de novos valores da canção nacional. A propósito, esclarece:
- Limitar-me-ei - que remédio! - aos meios mais refinados, ao plano vasto e, simultaneamente, limitado em que decorre a minha própria existência. Procuro indivíduos com imaginação, que componham música de qualidade e vendável. O Arnaldo Trindade é um comerciante. A tarefa que me encomendou subordina-se a objectivos comerciais. Tenho, porém, a maior liberdade de acção. O patrão, que também é um homem de vistas largas, dá-me carta branca. Estou, sobretudo, interessado em cantores dos subúrbios das cidades angolanas e moçambicanas. Acho que ainda existem aí estilos e técnicas originais e ignorados.
José Afonso procederá a uma investigação de carácter etnográfico. Paralelamente, preocupar-se-á com a sua obra e tentará libertar-se dos vícios que afirma afectarem as canções que compõe. Para tanto, propõe-se retirar da música "pop" os elementos necessários:
- Gostaria de ser capaz de fazer em Portugal, juntamente com outros, o que Edu Lobo, Caetano Veloso e Gilberto Gil - citando apenas aqueles que conheço - fizeram no Brasil, salvaguardadas, evidentemente, as devidas distâncias. De facto, o filão musical e a multiplicidade das experiências dos cantores brasileiros deixam-nos a perder de vista. De resto, a interpretação de música "pop" deve ficar para o Paulo de Carvalho que é exímio nisso.
Paulo de Carvalho permaneceu, por momentos, no centro da conversa. Segundo José Afonso, ele corre o risco de se transformar num cantor "pop" igual aos outros:
- Cantando em inglês, não contribuirá para o progresso da música especificamente portuguesa.
- Ouvir o Paulo de Carvalho será, pois, o mesmo que ouvir Tom Jones - alvitrámos.
José Afonso meneou a cabeça:
- Bem, eu gosto mais do Paulo de Carvalho. O que queria dizer era que, sendo um bom cantor "pop" de língua inglesa, ele interessará tanto ao público inglês como ao português.
Falámos, depois, acerca de projectos. Uma das principais preocupações actuais de José Afonso, consiste em mudar de casa. Durante o nosso longo passeio pelas ruas de Setúbal, ele espreitou para o interior de todas as vivendas com "escritos" nas janelas, situadas perto do cais. Agilmente, trepava pelas saliências das paredes e olhava, através dos vidros, as salas vazias. A escolha parecia difícil. José Afonso é um homem comum. E as suas apreensões e esperanças são as de um homem comum:
- Durante um ano e meio ou dois - não sei ainda - tenho de viver do meu ofício presente. Entretanto, tenciono melhorar as minhas canções, sobretudo do ponto de vista musical, dar-lhes um suporte instrumental de melhor qualidade. Depois, voltarei ao ensino. Isso acontecerá, inevitavelmente, quando já não tiver voz para gravar discos ou quando atingir a saturação e começar a repetir-me. Mas não escondo que o meu fundamental objectivo consiste em garantir a subsistência da família.

Será



Será que ainda me resta tempo contigo,
ou já te levam balas de um qualquer inimigo.
Será que soube dar-te tudo o que querias,
ou deixei-me morrer lento, no lento morrer dos dias.
Será que fiz tudo que podia fazer,
ou fui mais um cobarde, não quis ver sofrer.
Será que lá longe ainda o céu é azul,
ou já o negro cinzento confunde Norte com Sul.
Será que a tua pele ainda é macia,
ou é a mão que me treme, sem ardor nem magia.
será que ainda te posso valer,
ou já a noite descobre a dor que encobre o prazer.
Será que é de febre este fogo,
este grito cruel que da lebre faz lobo.
Será que amanhã ainda existe para ti,
ou ao ver-te nos olhos te beijei e morri.
Será que lá fora os carros passam ainda,
ou as estrelas caíram e qualquer sorte é bem-vinda.
Será que a cidade ainda está como dantes
ou cantam fantasmas e bailam gigantes.
Será que o sol se põe do lado do mar,
ou a luz que me agarra é sombra de luar.
Será que as casas cantam e as pedras do chão,
ou calou-se a montanha, rendeu-se o vulcão.

Será que sabes que hoje é Domingo,
ou os dias não passam, são anjos caindo.
Será que me consegues ouvir
ou é tempo que pedes quando tentas sorrir.
Será que sabes que te trago na voz,
que o teu mundo é o meu mundo e foi feito por nós.
Será que te lembras da cor do olhar
quando juntos a noite não quer acabar.
Será que sentes esta mão que te agarra
que te prende com a força do mar contra a barra.
Será que consegues ouvir-me dizer
que te amo tanto quanto noutro dia qualquer.

Eu sei que tu estarás sempre por mim
Não há noite sem dia, nem dia sem fim.
Eu sei que me queres, e me amas também
me desejas agora como nunca ninguém.
Não partas então, não me deixes sozinho
Vou beijar o teu chão e chorar o caminho.
Será,
Será,
Será!

terça-feira, julho 28, 2009

I'm free

Keith Richards / Mick Jagger

I'm free to do what I want any old time
I'm free to do what I want any old time
So love me hold me love me hold me
I'm free any old time to get what I want

I'm free to sing my song knowing it's out of trend
I'm free to sing my song knowing it's out of trend
So love me hold me love me hold me
'Cause I'm free any olf time to get what I want

So love me hold me love me hold me
I'm free any old time to get what I want

I'm free to choose who I see any old time
I'm free to bring who I choose any old time
Love me hold me love me hold me
I'm free any old time to get what I want

Melancholia

Letra: Carlos Tê

Um poente da cor do passado
um sépia quase sangue
um olhar sonolento para longe
um horizonte perdido

uma torre tombada
no xadrês do tempo

não há como voltar
à grandeza de ontem

e cai a nostalgia
como concha vazia
que a maré deixa aos pés
e rói a melancolia

um barquinho moderno no mar
com alma de argonauta
um herói cego por tanto ver
um velho sem comer

uma canoa no Tejo
um fado na taberna

e cai a nostalgia
como concha vazia
que a maré deixa aos pés
e rói a melancolia

e cai a nostalgia
como concha vazia
que a maré deixa aos pés
velha melancolia

Problema de expressão

Letra: Carlos Tê

Só pra dizer que te Amo,
Nem sempre encontro o melhor termo,
Nem sempre escolho o melhor modo.

Devia ser como no cinema,
A língua inglesa fica sempre bem
E nunca atraiçoa ninguém.

O teu mundo está tão perto do meu
E o que digo está tão longe,
Como o mar está do céu.

Só pra dizer que te Amo
Não sei porquê este embaraço
Que mais parece que só te estimo.

E até nos momentos em que digo que não quero
E o que sinto por ti são coisas confusas
E até parece que estou a mentir,
As palavras custam a sair,
Não digo o que estou a sentir,
Digo o contrário do que estou a sentir.

O teu mundo está tão perto do meu
E o que digo está tão longe,
Como o mar está do céu.

E é tão difícil dizer amor,
É bem melhor dizê-lo a cantar.
Por isso esta noite, fiz esta canção,
Para resolver o meu problema de expressão,
Pra ficar mais perto, bem mais de perto.
Ficar mais perto, bem mais de perto.

O hábito do monge

Letra: Carlos Tê

É difícil ser bom monge
num mundo de encher a vista
como é difícil fazer surf
num mar de ondas sem crista
e quando se cai muitas vezes
o mal está no surfista
mal daquele que cai muito
não é visto só avista
e já Arquimedes dizia
se não houver nada por baixo
só lhe resta o estilista

ai o monge anda aos papeis
em busca do hábito certo
mas a beleza tem rígidas leis
oitenta e seis
sessenta oitenta e seis

vê o grego no pedestal
está o segredo na pedra
ou no cinzel do criador
está no hábito ou no monge
no papel ou no actor
há tanta gente infeliz
a vestir no sitio certo
que por mais tons e feitios
hão-de ser sempre imperfeitos
e há os da Feira da Ladra
que parecem ser os eleitos

ai o monge anda aos papéis
em busca do hábito certo
mas a beleza tem leis
oitenta e seis
sessenta oitenta e seis

A grande pirâmide

Letra: Carlos Tê

Estuda essa lição
sobe cada degrau
do conhecimento
para seres alguém
para teres o teu momento
vais ter de subir
custe o que custar
qualquer meio vale
para lá chegar

à grande pirâmide
à grande pirâmide

depois de subir
tu vais saber tudo
mas não vais ter tempo
de perceber nada
porque o que te informa
não é conhecimento
é tradição e norma
sem questionar a forma

à grande pirâmide
vais querer chegar
à grande pirâmide
depois de lá chegar

não penses duas vezes
não fiques para trás
tu és um gladiador
vais ter um carro preto
com dois mil de motor
e uma vivenda murada
depois de lá chegar

depois de lá chegar
podes ver o nada
depois de lá chegar
podes querer saltar

da grande pirâmide
podes querer saltar
da grande pirâmide
já te falta o ar

à grande pirâmide
à grande pirâmide

GTI (GENTLE, TALL & INTELLIGENT)

Letra: Carlos Tê

O sonho dos meus amigos
é ter um GTI
não importa de que marca
de que cor
o sonho dos meus amigos
é ter um GTI
não importa se inglês ou japonês

eu ando pensativo
porque não tenho esse sonho
ando a pensar qual o motivo
porque não sonho com um GTI

o sonho dos meus amigos
é ter um GTI
não importa de que marca
de que cor
o sonho dos meus amigos
é ter um GTI
não importa se inglês ou japonês

os meus amigos riem-se de mim
por ser feliz assim sem sonhar com um GTI
eles não sonham que me basta ter-te a ti
a sonhar comigo desde que te conheci

o sonho dos meus amigos
é ter um GTI
não importa de que marca
de que cor
o sonho dos meus amigos
é ter um GTI
não importa se inglês ou japonês

desde que seja um GTI
desde que seja um GTI
p'ra que quero um GTI
se me basta ter-te a ti
eu não quero um GTI
deita fora o GTI
p'ra que quero o GTI
só me basta ter-te a ti

Impressões Digitais

Faz impressão o trabalho que se tem em ser superficial
Faz-me impressão e baralho o vulgar e o intelectual

Sinto depressão conforme perco tempo essencial
Sofro uma pressão enorme para gostar do que é normal

Deixo tudo para mais logo não sou analógico sou criatura digital
Tendo para mais louco não sou patológico como o papel vegetal

Faz-me impressão ser seguido imitado por gente banal
Faz-me um favor estou perdido indica-me algo de fundamental

Acho que o que gosto em mim o que me motiva é uma preguiça transcendental
E em ti o que me torna afim o que me cativa é esse sorriso vertical como uma impressão digital

Sinto-me uma fotocópia prefiro o original
Edição revista e aumentada cordão umbilical
Exclusivo a morder a página em papel jornal

Faz-me impressão o trabalho a inércia faz-me mal

segunda-feira, julho 27, 2009

Loja de Porcelanas

cla.jpg

O que fazia um elefante
na tua loja de porcelanas
sei que não me vais dizer

foi por ele que tu me trocaste
e eu nunca soube porquê
nem nunca virei a saber

às vezes a beleza dói
quando o olhar reflecte
o que o coração inventou

o que fazia um elefante
na tua loja de porcelanas
sei que não me vais dizer

entrou e saiu pela frente
deixou tudo em pantanas
e tu voltaste a sofrer

e quando o ideal cai
tudo aquilo que promete
nunca acontece

quinta-feira, julho 23, 2009

Tempo de Antena do Bloco - Julho 2009


A obsessão do défice de Manuela Ferreira Leite e de José Sócrates e as suas políticas liberais provocaram desemprego e deixaram milhares de pessoas na pobreza.




quarta-feira, julho 22, 2009

Ao vivo

Brigadeiro e Bispo

Aquilo


Eu sou a favor da aplicação da Taxa Tobin


Entrevista de emprego disparatada

Auto-Defesa contra frutas frescas

Aula de Italiano

O homem consertador de bicicletas

Ministérios dos andares disparatados

O Papa e Miguel Ângelo

Story Time

A piada sem desfecho

Apelo à sanidade

Apelo das pessoas extremamente ricas

O homem que termina as frases

Como não ser visível

Argument Clinic

O cavaleiro negro

O mais idiota

Funeral de Graham Chapman

Loja de Queijos

O melhor do mundo é o da Serra da Estrela! ;-)


The Drill Sargent

Momento

Uma espécie de céu,
Um pedaço de mar,
Uma mão que doeu,
Um dia devagar.
Um Domingo perfeito,
Uma toalha no chão,
Um caminho cansado,
Um traço de avião.

Uma sombra sozinha,
Uma luz inquieta,
Um desvio na rua,
Uma voz de poeta.

Uma garrafa vazia,
Um cinzeiro apagado,
Um Hotel numa esquina,
Um sono acordado.
Um secreto adeus,
Um café a fechar,
Um aviso na porta,
Um bilhete no ar.

Uma praça aberta,
Uma rua perdida,
Uma noite encantada
Para o resto da vida.

Pedes-me um momento,
Agarras as palavras,
Escondes-te no tempo
Porque o tempo tem asas. 2x
Levas a cidade
Solta no cabelo,
Perdes-te comigo
Porque o mundo é um momento.

Uma estrada infinita,
Um anuncio discreto,
Uma curva fechada,
Um poema deserto.
Uma cidade distante,
Um vestido molhado,
Uma chuva divina,
Um desejo apertado.

Uma noite esquecida,
Uma praia qualquer,
Um suspiro escondido
Numa pele de mulher.

Um encontro em segredo,
Uma duna ancorada,
Dois corpos despidos,
Abraçados no nada.
Uma estrela cadente,
Um olhar que se afasta,
Um choro escondido
Quando um beijo não basta.

Um semáforo aberto,
Um adeus para sempre,
Uma ferida que dói,
Não por fora, por dentro.

Pedes-me um momento,
Agarras as palavras,
Escondes-te no tempo
Porque o tempo tem asas. 2x
Levas a cidade
Solta no cabelo,
Perdes-te comigo
Porque o mundo é um momento........

Frágil

Põe-me o braço no ombro
Eu preciso de alguém
Dou-me com toda a gente
E não me dou a ninguém
Frágil
Sinto-me frágil

Faz-me um sinal qualquer
Se me vires falar de mais
Eu às vezes embarco
Em conversas banais
Frágil
Eu sinto-me frágil

Frágil
Esta noite estou tão frágil
Frágil
Já nem consigo ser ágil

Está a saber-me mal
Este whisky de malte
Adorava estar in
Mas estou-me a sentir out
Frágil
Eu sinto-me frágil

Acompanha-me a casa
Já não aguento mais
Deposita na cama
Os meus restos mortais
Frágil
Eu sinto-me frágil

Porto Côvo



Roendo uma laranja na falésia
Olhando um mundo azul à minha frente
Ouvindo um rouxinol na redondeza,
no calmo improviso do poente

Em baixo fogos trémulos nas tendas
Ao largo as águas brilham como pratas
E a brisa vai contando velhas lendas
de portos e baías de piratas

Havia um pessegueiro na ilha,
plantado por um Vizir de Odemira
Que dizem por amor se matou novo,
aqui no lugar de Porto Côvo

A lua já desceu sobre esta paz
e reina sobre todo este luzeiro.
À volta toda a vida se compraz,
enquanto um sargo assa no braseiro

Ao longe a cidadela de um navio
acende-se no mar como um desejo.
Por trás de mim o bafo do estio
devolve-me à lembrança o Alentejo

Havia um pessegueiro na ilha
plantado por um Vizir de Odemira
Que dizem por amor se matou novo,
aqui no lugar de Porto Côvo

Roendo uma laranja na falésia
olhando à minha frente o azul escuro
podia ser um peixe na maré
nadando sem passado nem futuro

terça-feira, julho 21, 2009

Chuva

"Embora lave o medo
que há do fim
a chuva apaga o fogo
que há em mim
Ouço a voz de quem
me quer tão bem
E fico a ver se a chuva
a ouvirá também..."

Everybody Hurts

(Berry/Buck/Mills/Stipe)

When the day is long and the night, the night is yours alone,
When you're sure you've had enough of this life, well hang on
Don't let yourself go, 'cause everybody cries and everybody hurts sometimes

Sometimes everything is wrong. Now it's time to sing along
When your day is night alone, (hold on, hold on)
If you feel like letting go, (hold on)
When you think you've had too much of this life, well hang on

'Cause everybody hurts. Take comfort in your friends
Everybody hurts. Don't throw your hand. Oh, no. Don't throw your hand
If you feel like you're alone, no, no, no, you are not alone

If you're on your own in this life, the days and nights are long,
When you think you've had too much of this life to hang on

Well, everybody hurts sometimes,
Everybody cries. And everybody hurts sometimes
And everybody hurts sometimes. So, hold on, hold on
Hold on, hold on, hold on, hold on, hold on, hold on
Everybody hurts. You are not alone

Primeiro Beijo

Recebi o teu bilhete
para ir ter ao jardim
a tua caixa de segredos
queres abri-la para mim
e tu não vais fraquejar
ninguém vai saber de nada
juro não me vou gabar
a minha boca é sagrada

Estar mesmo atrás de ti
ver-te da minha carteira
sei de cor o teu cabelo
sei o shampoo a que cheira
já não como, já não durmo
e eu caia se te minto
haverá gente informada
se é amor isto que sinto

Quero o meu primeiro beijo
não quero ficar impune
e dizer-te cara a cara
muito mais é o que nos une
que aquilo que nos separa

Promete lá outro encontro
foi tão fogaz que nem deu
para ver como era o fogo
que a tua boca prometeu
pensava que a tua língua
sabia a flôr do jasmim
sabe a chicla de mentol
e eu gosto dela assim

Quero o meu primeiro beijo
não quero ficar impune
e dizer-te cara a cara
muito mais é o que nos une
que aquilo que nos separa

Manhã submersa

Letra: Tim

O frio aperta
Na manhã submersa
Entre a neblina com o sol a
Nascer
Contando os passos para se
Entreter
Lá vai ele ainda a sonhar

Não sabe o nome
Mas conhece o cheiro
Quando ela entrar
No apeadeiro

Talvez à tarde
Quando a escola acabar
Mesmo à saída
A bola a girar
Ela apareça
E ele consiga falar

A rapariga saiu da escola
Viu os rapazes a jogar à bola
Passou por eles houve um que
Sorriu
Não ligou e a rua subiu

Só mais tarde, já ao deitar
Olhou o espelho onde
Foi encontrar
O amor escondido
E então sorriu

sexta-feira, julho 17, 2009

Letra S

Quero ser só,
Quero ter só algo mais,
Que eu nada sou sem companhia.
Diz-me quem eu sou como se o não fosse.
A rua quebra-me a força negativa.
Sorrir,
Não é pêra doce!
Diz-me quem eu sou como se o não fosse.
Matei o monstro da monagamia,
e a minha vida parou na letra S.
A minha mão não quer,
Que eu mate agora,
Eu mesmo nunca sei.
Eu posso dar,
Posso dar mundo,
Tal fosse um copo grande embora sem o fundo.
Eu não entendo mas amo quem tu és,
E que assim sendo padeço a teus pés.
Matei o monstro da monagamia,
e a minha vida parou na letra S.

Tudo o que eu te dou

Eu não sei, que mais posso ser
um dia rei, outro dia sem comer
por vezes forte, coragem de leão
as vezes fraco assim é o coração
eu não sei, que mais te posso dar
um dia jóias noutro dia o luar
gritos de dor, gritos de prazer
que um homem também chora
quando assim tem de ser

Foram tantas as noites sem dormir
tantos quartos de hotel, amar e partir
promessas perdidas escritas no ar
e logo ali eu sei...

(Que) Tudo o que eu te dou
tu me dás a mim
tudo o que eu sonhei
tu serás assim
tudo o que eu te dou
tu me dás a mim
e tudo o que eu te dou

Sentado na poltrona, beijas-me a pele morena
fazes aqueles truques que aprendeste no cinema
mais peço-te eu, já me sinto a viajar
para, recomeça, faz-me acreditar
"Não", dizes tu, e o teu olhar mentiu
enrolados pelo chão no abraço que se viu
é madrugada ou é alucinação
estrelas de mil cores, ecstasy ou paixão
hum, esse odor, traz tanta saudade
mata-me de amor ou dá-me liberdade
deixa-me voar, cantar, adormecer

quarta-feira, julho 15, 2009

Ilha



Vivo numa ilha sem sabor tropical
a fauna é variada demografia acidental
não é de origem elevada díficil de recensear
é mais que uma ilha é quase continental
não está cercada por água mas não faz mal
quem a rodeia por vezes é a força policial
Baby Doc ou Papa Doc nunca vi
nem qualquer ditador da America Central
cá não há candidato á autarquia local
só orgulho analfabeto mas com cultura geral
é tudo a mesma fruta a mesma caldeirada
é uma gente educada é a anarquia total
vivo numa ilha sem sabor tropical
não é de origem vulcânica
mas tem lama no Natal
não há saneamente básico
é o Bairro Oriental

Jura

Letra: Carlos Tê
Música: Rui Veloso

Jura que não vais ter uma aventura
Dessas que acontecem numa altura
E depois se desvanecem
Sem lembrança boa ou má
E por isso mesmo se esquecem

Jura que se tiveres uma aventura
Vais contar uma mentira
Com cuidado e com ternura
Vais fazer uma pintura
Com uma tinta qualquer
Que o ciúme é queimadura
Que faz o coração sofrer

Jura que não vais ter uma aventura
Porque eu hei-de estar sempre à altura
De saber
Que a solidão é dura
E o amor é uma fervura
Que a saudade não segura
E a razão não serena
Mas jura que se tiver de ser
Ao menos que valha a pena

sexta-feira, julho 10, 2009

Lua

Mais um dia que acaba
e a cidade parece dormir,
da janela vejo a luz que bate no chão
e penso em te possuir.
Noite após noite, há já muito tempo,
saio sem saber para onde vou,
chamo por ti, na sombra das ruas,
mas só a lua sabe quem eu sou.
Lua, lua,
eu quero ver o teu brilhar,
lua, lua, lua,
Eu quero ver o teu sorrir.

Leva-me contigo,
mostra-me onde estás,
é que o pior castigo
é viver assim, sem luz nem paz,
sozinho com o peso do caminho
que se fez para trás...
Lua, eu quero ver o teu brilhar,
no luar, no luar.

Homens de chapéu e cigarros compridos
vagueiam pelas ruas com olhares cheios de nada,
mulheres meio despidas encostadas à parede
fazem-me sinais que finjo não entender.
Loucas são as noites, que passo sem dormir,
loucas são as noites.
Os bares estão fechados já não há onde beber,
este silêncio escuro não me deixa adormecer.
Loucas são as noites.

Refrão

Não há saudade sem regresso, não há noites sem
madrugada,
Ouço ao longe as guitarras, nas quais vou partir,
na névoa construo a minha estrada.

Loucas são as noites, que passo sem dormir,
loucas são as noites.
Loucas são as noites, que passo sem dormir,
loucas são as noites...